27 dezembro, 2009

Iracema você atravessou na contra mão

E foi que à beira do casamento vem um carro e pincha ela no chão. Parece Iracema, que Adoniran fez só guardar suas meias e sapatos por ter perdido seu retrato. E foi que à beira da rua ela se viu nua esmigalhada mas já era tarde tarde. Tarde pra entrar de branco na igreja, veja, quando ela já se via toda vermelha. E o chão vermelho e quente, sente que lhe queima a cara, as costas e o lado e o que era aquele escuro vindo lindo e engolindo toda a árvore verde e a moça de vestido amarelo caramelo que ela sarreou antes em mente. Ficando escuro escuro até virar coisa da cabeça lá no fundo no fundo do sub inconsciente inconsistente. Até parecer sonho. Até ficar pouco claro ao ponto tonto de lhe parecer outra língua. Até não sentir a língua e o salto dela quente de repente no asfalto.

24 dezembro, 2009

Só natal

pra me fazer acordar de bom humor

23 dezembro, 2009

duas

Eu tento parar de comer e ela tenta parar de fumar. Ela me inveja porque cigarro eu fumo às vezes, mas não me apetece. Eu a invejo porque comida ela come, mas não aprecia. Sorte minha que fico a mordiscar os ossinhos dos seus quadris. Sorte dela que eu não lhe cerro os maços.

22 dezembro, 2009

Mania

essa mania eu te amo essa mania de ligar todos os dias pra perguntar sobre ele. O dia. todo ano. Essa mania de natal, peru choro e coisa e tal. essa coisa ilegal de ano novo esses fogos no céu e eu te amo na terra sempre outra vez, só pra evitar o de novo ... mas fica sempre tão igual.

12 dezembro, 2009




Ela é uma diva.
Eu vou escrever um livro, ele disse antes de soprar a fumaça do TE. Ele ia, ela sabia. Porque aquela pretensão despretensiosa tinha um caráter novo baiano, e o pouco que ela sabia sobre era suficiente para que visse o nome dele abaixo do título de um livro de sua prateleira.

11 dezembro, 2009

dia de chuva

Não, não.
Coisa de dia de chuva mesmo. Preguiça, sono, abre a geladeira, fecha a geladeira e chaveschapolim.
Não é romantismo nem depressão. é o cinza mais lindo que eu já vi brilhando lá fora.
a preguiça escondida debaixo do travesseiro que eu fui buscar. a geladeira, a chave e o chaves. todo mundo olhando a água escorrer do ceu sorridente. a porta enchavada. da geladeira. o chaves e o chapolim.







e sem blablablá

09 dezembro, 2009

:

espero um dia transformar meus pretextos em pré textos, tão habilmente textuais quanto o.

07 dezembro, 2009

Fim dos dias

- Tem dois
- Quê?
- Tem dois, . Tem dois ali na janela.
- Na verde ou na branca?
- Na rosinha salmão, ali perto do canteiro.
- Ah. Safados ?
- ?
- Olha lá, nos beijos e abraços.
- É, uai. Pra que ser diferente?
- Sei lá. Essa troca de baba é muita... muita maldade com o pobre Juca.
- Ara. E as pinga toda todo dia?
- Pinga toda todo dia?
- É, pinga toda todo dia minha fia. Bafo de cachaça do marido todo dia faz a muié oiá do lado e perceber os... os.. os feromônimo dos otros homem... entende?
- Feromo..nomino?
- FEROMONIMO!
- Que isso?
- É o que deixa as muié no ponto. Coisa de cheiro, pele.
- ...
- Que foi.
- Zuzinha, cê anda vendo novela demais.
- Pucadiquê?
tremelicando na cadeira de balanço.
- Seu cheeeeiro!! uuuii. Sua pele!!
- ... ... ...
- Tá olhando feio por que?
- Que isso Maria. Parece que tá com comichão.
- Ara. Só te imitando pra te explicar.
- Ce tá me explicando pra me confundir.
- ...
- Olha lá, olha lá. Que abraço bonito.
- Parece amor, Zuzinha.
- Nada. Amor tá fora de moda, fia. É só... tesão.
- TESÃO, Zuzinha? De onde cê tirou essa safadeza?
- Das entranhas, uai. De onde mais?!
- Menina Zuzinha do céu!
- Ah vai. Vai dizer que naquelas noite escura, que cê fingia que tava dormindo, não sentia um comichãozinho enquanto o Zé te bulinava?
- Creio em Deus pai, Maria. Cê tá loca?
- ?
- Eu tive 32 anos de casada e nunca dei um beijo na boca!

aquele rosto assustado da Zuzinha era indescritível em palavras.

- Criei meus 5 filhos sob os olhos do padre.
- ...
- Enterrei meu marido e uso preto desde lá.
- E donde cê tirou que tem que ser assim?
- Minha mãe . Minha nona, minha bisa. Cê que devia seguir o exemplo dessas santa mulheres.

- Acha, Maria. Cê tá precisando parar de ir na igreja e ir no forró da terceira idade.
- Creioemdeuspai Zuzinha. Cê que tá precisando parar de ver novela.
- Cê que tá precisando de um vibrador.
- Eu já tenho, Zuzinha.

quanto tempo uma pessoa demora para ultrapassar um obstáculo cognitivo?
Demorou exatamente isso mesmo.

- QUÊ? Você já tem?
- , todo mundo tem. Mas eu não gosto muito não.
- POR QUE?
- Porque não dá pra ouvir se eu lavando roupa. Gosto quando faz barulhão mesmo.
- Barulhão, Maria? Barulhão?
- É . Quer o número?
- Número?
- Do meu vibrador
- Não Maria, eu tava brincando. Que semvergonhice, eu lá quero saber o nú...
- Ah vá, todo mundo tem hoje em dia, num é pecado. Anota aí. 97 33 03 03
- ...

a cara da Zuzinha era plena falta de palavras.

- Que susto, Maria.
- , por que?
- Achei que o mundo tava desandado.
- Que isso. A gente tem que se cuidar porque o apocalipto tá chegando
- A poca o que?
- Quando DEUS vai voltar pra terra e julgar TODOS nós. Vai ter ... ter... choro e ... como chama?
- O que?
- Tipo aquilo que o Zé fazia cos dente enquanto me bulinava.
- Ranger de dentes.
- É, é.. isso aí. Vai ter choro e ranger de dentes.


- ...
- ...


- Esses dois nesses amassos.
- Calor né.
- É.
- É o buraco na camada dionísio.
- É. As fumaça de carro tão acabando com o dionísio!
- Fim dos dias.
- Fim dos dias.

03 dezembro, 2009

mais do mesmo

Escrever:
- Escrever...
Escrever.

em cada ponto final estou eu, boca aberta, em um grito sem som.

27 novembro, 2009

Um minuto de ar

Um mililitro depois de ter visto tal cena incomum, ou duas horas de areia antes do caso da menina imparível. Aqueles quilômetros todos de gotas d'água se desfizeram em cinco centímetros de poema insensível.

22 novembro, 2009

você é tão vinho branco
e eu
tão cachaça

21 novembro, 2009

Simples

- Você tem seu lugar aqui
não apontou para o coração para não cair no ridículo clichê
ele entenderia
- Você também.
- Como uma de minhas grandes paixões.
- Eu te amei, sabia?
fez que sim com a cabeça, mas não sabia não
Só pelo costume de fazer sinais positivos
quando se surpreende com o que ouve
- É que a gente era complicado
- E se resolvia sem palavra alguma
- Tão iguais
- Tão bonitos
poderia ser de Tarantino esse tipo de conversa
num lugar tão estrategicamente comum
fazia o calor terceiro-mundista dos trópicos,
falavam de sentimentos tão sofisticados
entre um óleo de oliva e uma comida mal comida
- E tão diferentes
- Tão.
- Mas eu gostei
- Também
- Também.
era verdade
e eles sabiam
mesmo que não fosse mais preciso

tudo tinha sido feito para não caber
no tempo que estiveram no momento que passaram

mais simples que isso
tão impossível
quanto desnecessário

16 novembro, 2009

hoje é um daqueles dias que eu largaria qualquer rock and roll para ouvir só Cartola

12 novembro, 2009

Inicío / parte x de uma história sem nome: (sem nome)

Ele tocava violão e acompanhava o Edu Lobo. Ela cantava acompanhando o Chico. O Chico ria, o Edu Lobo ria, eles riam também no moquifo em que moravam.

- Certamente naquele tempo tudo era tão bom. Olha lá, eles cantam, tocam, bebem whisky e fumam charuto o tempo todo. Redes, cadeiras, tudo colorido... aquele conforto anos 70. Que coisa linda. Volta naquela música!

Eles no sofá rasgado coberto com um lençol rasgado. Na mesa copos sujos de café e cachaça. Copos coloridos, maços de cigarro, cartazes irônicos, fotos alegres, cores. Muitas cores. Aquele conforto escondido e ainda sem data definida. Um dia se alguém assistisse um vídeo dos dois ali, com certeza diriam o mesmo que eles do Chico e do Edu.

10 novembro, 2009

des

deixar de pensar = despensar = dispensar ?

06 novembro, 2009

eu ainda serei uma grande-quase-esperta-terceiro-mundista. ah vou!

05 novembro, 2009

Coisa de leveza

coisa de leveza rosa chá seda e pluma semimporta ser coesa quase nada desnuda louca pra se dar nessa prosa qual ela usaria ser ousada?

sobre medidas

Apesar dos dias, preenchidos de horas preenchidos de minutos preenchidos de infinitos que ela mesma, apesar de saber tratar-se bem com ele, não entendia completamente mas; apesar dos infinitos, os dias se arrastavam tortos na porta do guarda roupa, nas roupas, na cama e nas paredes imundas. Imperceptivelmente arrastava-se ela também na infinidade de pessoas e oportunidades e mentiras e verdades e fatos quase até interessantemente confundíveis - o trago da vida - o espaço-tempo aberto à procura de um estanque que não viria sem ele - o infinito espaço transformando-se em algo concreto e contradizendo o paradoxo do homem e da tartaruga (e outras coisas que matemáticos estudam).
Tateava ela, tateava ele - o infinito - talvez porque o infinito não permita qualquer tipo de controle quando ele é o que se tem por medida. Tateava também ele - no infinito. Dançavam juntos a uma distância infinitesimal de palavras, poemas, músicas, cervejas, pessoas, deveres, diversões, vodcas, corpos e camas. Por mais que se movimentassem nos dias, cabia-lhes a espera pela movimentação dos astros que não acreditavam, das viagens psicodélicas que buscavam e pela infinidade de palavras que não encontravam. A espera era translúcida com unhas longas de arrepiar, excitar e ferir; cheia de infinitos meios de juntar e separar dois corpos numa infinidade de pessoas.

28 outubro, 2009

encostou os bigodes nas cartas e apostou mais duas fichas.
- Mais um vermute - adiantou-se à menina de saia que passava mais rápida que os olhos dos outros apostadores uns nos outros.
Um deles era Argentino, o que dava àquela mesa um ar de desconfiança desigual.
O mais moço sentia o suor descer pelas costas e molhar a ponta da cueca, e balançava-se na cadeira para secar as costas na camisa.
O mais velho coçava os olhos que acabavam de ser dispertos.
Não percebia nada o de óculos, que olhava os seios acesos da menina de saia.
Hoje era o dia de sorte de todos eles.

24 outubro, 2009

Vinho e carta

abri o vinho

depois a carta

linda letra

tinto seco

terminei a garrafa

mandei a carta

devidamente amassada

ao raio que a parta



não sou dado a paixões etílicas



22 outubro, 2009

à mo

espaço e tempo me confundem

nesse ir e vir de mim nas horas

portanto

ex-passo o tempo

20 outubro, 2009

0e30

escorrega o lençol entre as pernas, aperta botões que quase não sabe, luz na cara, gosto na boca. Abre os olhos, fechassim é melhor. Acaricia o travesseiro pra esconder um sorriso. Tenta parar de pensar em coisas boas, como se o metapensamento não fosse só um método de se permitir pensar.

18 outubro, 2009

questão de espaçovírgula

Ana saiu do mar é assim, metricamente

Ana se foi com a maré, assimetricamente

15 outubro, 2009

Homo não sapiens

o homem sapiens sabe
da histérica capacidade que tem

a de levar do chão, ainda que sem asas
a si e seus objetos para cima
e a dos poetas, histéricos babacas
a de transformar amor em rima

12 outubro, 2009

me veio que:


O que sou eu

senão eu

sendo o tempo todo?


(noção de si que em si não ajuda, mas fortalece a importância do criticado gerúndio.)

11 outubro, 2009

Da teoria

Três horas depois ele se deu conta de que tinha esquecido o motivo da conversa. Perdeu-se no caminho assim que o barbudo da cadeira do canto esquerdo lhe questionou o motivo de toda teoria. Não havia, ele sabia.Mas pensava que quando a teoria é boa ela se vale da beleza da auto criação. O barbudo do canto esquerdo convenceu os outros doze, barbudos ou não, e ele teve apenas mais quarenta minutos para se explicar. Insuficientes, já que explicar motivos requer mais intensidade dialética que explicar o fato em si. Ele decidiu, então, deixar a barba crescer, porque questionar os motivos dos outros requer menos tempo e intensidade dialética do que criar e ter motivos.

08 outubro, 2009

Chá de cacto

Hoje de manhã ela estava tomando café e conversando com seu cacto. Ambos os três ouviam novos baianos. Ele - a planta - , concluiu e ela teve que concordar: aquela manhã nublada foi uma das mais ensolaradas da semana.
Com cacto não se discute.

07 outubro, 2009

Ah. O sabor colorido. Alguém em sã consciência viveria sem?

05 outubro, 2009

Cana

a causa do meu problema
é que aquilo fica ainda mais bacana
com um pouco de cana
uma falta da cama
e uma sobra de distância

02 outubro, 2009

(...)

Por vários dias vi o mesmo aviso. Fechado para balanço. E eu me perguntava que tipo de economia tinha aquele moquifo para balançar tanto. Mortadelas davam tanto dinheiro? Pão dormido? Aquele pão era um soco no meu estômago toda a manhã, fato. Aquele olhar do portuga que me atendia outro passaporte para um dia mau humorado como o portuga, o dia todo. O que não era bom, pois eu trabalhava com público - vendedora? - Não, eu dizia. Atriz. - e trabalha? - Sim, sou, além de atriz, professora - E trabalha?.

Não as pessoas não perguntavam pela segunda vez, mas o olhar era de pleno questionamento. Olha só que inteligente, dizia minha mãe. Tão inteligente que escolhi ser professora e depois me escolheram para ser atriz. Duas profissões que não são vistas como. Azar o meu. Azar o meu o olhar do portuga encher meu dia de raiva com meus alunos que não aprendiam a divisão por números inteiros e com o meu diretor que sempre pedia "mais emoção, mais alegria". Alegria é o caralho! Não, eu não chegava a dizer, mas meu olhar era pleno vai tomar no cu. Por isso comecei a fazer papel de vilãs e achei o máximo. Meu sonho, minha plenitude.
Tudo culpa do portuga. E logo semana passada, quando decidi agradece-lo pelo prêmio que recebi pela minha melhor vilã, ele se fecha pra balanço. Ao menos eu havia sido premiada enquanto ele fazia continhas na calculadora, no centro de um amontoado de livros amarelos que contabilizavam desde e a época do cruzado. Continhas que meus alunos não sabiam fazer. Imaginar a cena do portuga amanhecido com as continhas, no meio da padaria, da mortadela e do pão também amanhecido, enquanto eu olhava a placa mal escrita a caneta bic; era uma vingança deleitosa por todos aqueles anos e mau humor que ele me causava.
(...)

01 outubro, 2009

P e Lo

pelo que ri, sorrio

pêlo que eriça, arrepio

28 setembro, 2009

começar e

É fácil demais começar. Sabe aquele impulso, aquele arrepio na barriga, aquela cabeça cheia de ideia? Cabeça fervilha enquanto os olhos se distraem em qualquer pouco movimento que se faça. É assim: uma cabeça cheia de ideias e um impulso. Depois manter todo aquele fervor inicial é um desafio pra todo o dia, todos os dias. É olhar pra cenas cotidianas à espera de algo. E geralmente consegue - incrível, mas o convívio com o mundo ainda inspira. Depois manter toda aquela observação apurada é um desafio pra todo o dia, todos os dias. É acordar e tomar café pra esperar por algo, alguém, alguma notícia. Qualquer coisa que alegre. Qualquer coisa que provoque. Geralmente consegue. Fica-se - ou faz-se - feliz com pouco. Mas manter aquela felicidade toda cansa e se torna um desafio para todo o dia, todos os dias. Então procura outras inspirações em algo que entristeça. A dor passa a ser o próprio remédio da doença. Dor dilacerante e confortante. Mas, depois, manter todo aquele sofrimento, aquele pesar com o mundo se torna um desafio para todo o dia, todos os dias.
Irritante. É aí que ele sai daquela lama toda e vai viver ao invés de escrever.

25 setembro, 2009

gol

Se você ganhasse um assim ó, me daria umas coisas da feira e um dinheiro pra uma sopa pramanhã. dá? Vai chegar cansado, sopa boa, mas não adiantava falar que ele teimava em ver o fla flu em cima da mesinha. Saco. E eu ainda me perguntava da dor no pescoço, deve ser o travesseiro, bem. tá velho, vê? Gol! Viu nada, viu nada sempre. Falo da janta, feijão do jeito que você gosta. mas ele pega só os bifes durante o intervalo pro segundo tempo e faz uma porção apimentada, estilo buteco, que ele me xinga de não ir. feijão esfria e fica pra mim. comer sozinha, e sem mistura.
recolher as roupas do lado da privada, onde já se viu. Parece um porco. Quando a gente era novo, olha que bonito gente: vestidinho verde e ele de camisa branca. A barba eu gostava, era charme. Agora. Porco. Me dava flor de laranjeira antes: olha só que bonito, vê? Ele me amaldiçoa porque fizeram gol, porque meu bem? Gol. Ah. Falta o que? Empurrão de homem no campo é falta. Falta de vergonha, falta do que fazer, só pode. Deixa pra lá esse porco. Fazer o que? Casei na igreja, não sou mulher de chilique. Fazer o que? só se eu fizesse gol pra ele olhar mesmo em mim.

24 setembro, 2009

dia de

O problema é que eu não estava preparada para tanto. Tanta bebida, tanta comida, tanta roupa a menos. Esqueci de me pentear, tomar o vermelho depois do jantar e uma dose de vodca a menos, pra contrariar.
Era dia de alegria, alguém dizia. E eu fumava um cigarro enquanto almoçava meu shake emagrecedor com 21 vitaminas. Coisa da tia gorda de minas, ao som da Janis, que é pra ficar mais clichê. Era dia da alegria e eu não via, nem tinha. Que era um dia comum de pessoas felizes comuns. Era uma janela, uma mulher desgrenhada e viva, tomando shake no liquidificador porque todos os copos estavam sujos. Que era a cama desgrenhada.
Era o dia de alegria
E o bairro fedendo churrasco ao som de Bezerra da Silva.

22 setembro, 2009

era sede

Brigavam, batiam-se. Era pura sensualidade aqueles dois. Batiam-se. Ela colocava pimenta no arroz dele, ele guardava toalha molhada no travesseiro dela. Era um fervor, uma fúria. Os dois, um sem o outro, eram pouca coisa. Um risinho bonito ali, umas mãos carinhosas lá. Mas juntos eram sede. Fome e pouca comida pra tanto.
Brigavam e batiam-se. Depois apaixonavam-se um pela carne do outro e amavam-se tête-a-tête. Era de uma fúria vitoriosa para os dias de hoje. Era fome de carne um do outro.

cuti cuti

que formoso!
fala de coração, amor, um campo cheio de flores e umas coisas coloridas/cheirosas/macias. Todo harmonioso.
Olha que coisa mais linda! Encaixado, pomposo.
Poema é coisa fofa, não?

Não.
- Cade o * , estou com saudades de ler.
- Estou escrevendo em um lugar mais escondido.
- Sério?
- Quero voltar a escrever por paixão. Eu sei que você me entende...
- Sei como é. Pra se sentir livre.
- É complicado, quando eu sei que certas pessoas estão lendo, fico amarrado. Eu não quero mais isso. Quero ser livre, pelo menos no meu blog.

21 setembro, 2009

ó que bonito

"a tua presença entra pelos sete buracos da minha cabeça"
(A tua presença - Caetano Veloso)

18 setembro, 2009

como os outros

Como todos os outros, eles tentaram ir a novos restaurantes e novos motéis. Mas ela ficava desconfortável, preocupada em agradar, e ele se chateava. Tentaram trepar em lugares públicos, o cúmulo depois que pensaram sobre. Era desespero. Era por desespero que se obrigavam a preocupar-se um com o outro. Início de fim, ele disse pra si mesmo quando o pau não subiu e ele teve vergonha de dizer que naquela noite não dava. Ela também nem estava molhada, ele não notou. Antes. Antes o pau era duro, ela molhada e ele não tinha vergonha de falar que não queria naquela noite, ela entendia: beijinho e dormir abraçado.
Tiveram amantes, mais ela do que ele, mas piorou. Ambos, separadamente, notaram que estavam se apaixonando pelos amantes e a intenção era temperar o casamento. Isso existe? Pra personagem tudo existe. Depois, então, o divórcio saiu rápido porque não tinham filhos, que sorte. Ela emagreceu, ele aprendeu a dançar. Casaram. Ela com a Ana, ele com a Julia. E foram amantes um do outro.

17 setembro, 2009

quando vai acontecer a ida, vista de lá pra cá?
quantas vezes você lembrou daquilo hoje?

16 setembro, 2009

setemeiadeus.amém.
só dois. só dois minutos para odiar. é tempo suficiente.

Carne Crua

Eu comeria sua carne, comeria lentamente depois de te amolecer na minha saliva. fazer você mole, carne mole e crua
carne sua nua, sensualmente temperada de suor e hormônio à flor . flor ou fruta, eu desfruto.

comer
deglutir
escorrer entre os lábios
grossos sorridentes frescos
lamber os lados, os cantos,
os vincos da boca gorda e rosa
sorridente escorre bacanal
escarnando dor deliciosamente
bem feita
bem proveita
bem gozada

15 setembro, 2009

inventa que venta

balança, pende
cai e volta
verte o movimento
reverte o sentido
inventa que pensa
sente, senta e vai outra vez
brinca com o brilho e sem
querer
brilha

renomado

ele era bem novinho quando seu pai lhe deu uma surra e um castigo de uma semana, e assim por acaso, como quem não quer nada, ouviu todos os discos da mãe, que nem mais a mãe ouvia, da Ella Fitzgerald. Leu várias Clarices e outros sobre a história da segunda e outras guerras. Leu um de como desenhar com o lado direito do cérebro que só foi entender quando fez curso de desenho em uma renomada. Foi por causa do castigo que hoje ele tem várias crises de meia e inteira ou quase toda idade, não por culpa direta do castigo, mas dos discos, livros, do desenho e de hoje ele ser um renomado. Ele nunca entendeu o conceito de renomado.

14 setembro, 2009

posta restante

Fiquei tão longe esse fim de semana, desculpa. Antes que você precise me procurar para perguntar, já que eu nunca falo, te digo que não é culpa sua nem tem algo da devolução que fiz. É que ando ansiosa/preocupada/puta da vida com alguma coisa que não sei bem o que é. Seria mais fácil se eu acreditasse em inferno astral ou no clichê da crise de pessoas de personalidade. Ou em "era mais fácil quando eu não precisava me preocupar em ser mulher". Mas, bem. Deu um peso na cabeça hoje de manhã quando eu vi seu recado de quinta feira. A noite prometo de dar um abraço de "sorry" para ver você "sorryndo". Ou não, porque essa piada já perdeu a graça. Mas, enfim, bom dia chuvoso a você.

sono leve

Aperta o despertador, como se sufocando ele parasse de gritar. Não pára. Acerta o botão certo e volta a dormir. Sono leve na cama com cheiro de verdade. Sono leve na cama sem mais aquele cheiro de sonho. Sono leve só.
Despertador esperando a hora de gritar enquanto ela geme. Ela revirando o cobertor desnecessário pelo calor das 10 da manhã do dia da alegria de segunda feira. Chuta algumas roupas no pé da cama e espera a hora do despertador gritar. Alguém ri lá fora, deve ser a tia da limpeza. Esqueceu de lhe oferecer café hoje, porque nem fez, apertou o botão do despertador e gemeu. Chutou uns nadas na cama e caiu num sono leve, que permitia ouvir a risada lá fora. Alguém gritando alguma coisa sobre o almoço e um cheiro de bife com queijo muito pesado no sono leve dela. Sorri de modo tão leve que nem percebe, nem vai almoçar comida pesada entrando no corpo leve dela. Joga o cobertor no chão e lembra da piada feita sobre ele na noite anterior. Ela já não espera mais, ou espera mais agora já que se fez feito o que queria. Mas o despertador ainda espera. Espera.

10 setembro, 2009

só pra Ela

Ela secretamente não tinha apreço pelo romantismo, mas quando Ele subiu a escadaria do seu prédio encharcado pela chuva daquele domingo de manhã para lhe devolver o Leminski, Ela não pôde sentir nada menos que um carinho morno que subia do estômago até as faces e a fez lembrar de engolir a saliva. Foi aí que percebeu, sua boca estava seca e era tarde demais para repensar a aproximação que ambos se tinham permitido. Pensou em sã consciência: merda.

Ela não era dada às cores rosas que a vida propunha, nem aos grandes clássicos escritores. Gostava do Bukowski, o velho safado, da geração beat e dos poetas malditos. Sabia que ser uma mulher culta e gostar de tais escritores eram fatos que, para muitos, não se acompanhavam. Mas Ela não se importava. Não pelo cinismo dos jovens que dizem não achar necessária a aceitação do outro para aceitarem a si mesmos. Já que deste modo, cínico, eles buscam ser aceitos pelos descolados adeptos do "foda-se". NEla era verdadeira a desimportância com o senso comum, para o qual uma pessoa pensante não pode gostar de alguma música popular, de Bukowski ou Tropa de Elite.

Seus textos eram muitas vezes inocentemente escatológicos e escondiam seus medos, pudores, excitações, paixões e suas histórias, amores e ilusões, críticas e sugestões. Dissolvidos engenhosamente em seus personagens, vezes pela dificuldade de falar de si, vezes pelo fato de usar o "Ela" e "Ele" ser mais bonito esteticamente do que usar nomes próprios. O uso da primeira pessoa cria a primeira pessoa que lhe apontaria um dedo e ela poupava-se disso. Afinal, os textos eram dEla e neles Ela podia exercer seu poder de ser egoísta. E eles não precisavam de nome, qualquer excêntrico personagem pode ficar ridículo ao autor se chamar-lo de João ou Frederico. Ela gostava do poema cru e achava o dos novos baianos "se eu não tivesse com afta eu até faria uma serenata pra ela" a expressão mais puramente romântica. O resto era encher linguiça.

Mas naquele dia a chuva lhe trouxe Ele e o sentimento e o livro de Pablo Neruda. O poema da rosa de sal Ela pediria para Ele lhe recitar ainda por muitos dias, chuvosos, frios e quentes ou feitos quentes debaixo do cobertor, pra dizer assim no ouvido, baixinho e só pra Ela. E Ela escreveu, escrevia, escreve. Sempre ouvindo repetidamente alguma música sem deixar explícito. Depois da devolução do Leminski Ela escreveu histórias ao som de "Suburbano Coração", do Chico, encantada com a sonoridade e signo da letra encaixada em uma melodia confortável. Ela se sentia confortável porque a música era feita pra Ela, era dEla naquele momento. Era o belo sem ser rosa, o isento de virar roteiro de novela. Era ela colorida e sem vergonha. Ela virando no sofá, sofá virando cama. Pela primeira vez se deu conta que não era possível passar impune pela paixão das coisas que se encaixam nos defeitos dEla.
Papéis se romperam em palavras mudas:
...
... ,
...
Cheios de entrelinhas
Cheios de vida
Nasalados,
...
... !
...
Era o que Ela queria achar nas vidas alheias.
...
E assim foi secretamente, durante o tempo em que não era preciso se preocupar com literatura.

08 setembro, 2009

pelo direito das xoxotas

Acredito que toda xoxota tenha direito de vir sem lacre em embalagens de amostra grátis. Colocar a xoxota em vidros de palmito para dificultar seu acesso não é de forma alguma uma demonstração de respeito à ela, ao contrário: é uma forma de cultuar os braços fortes que as abram, compreende?
O falso culto excessivo à xoxota além de causar sua desvalorização, provoca queda do usufruto de um bem tão precioso. Veja bem, um bem precioso e tão comerciável não deve ser colocado na última prateleira, e sim nas gôndolas de guloseimas que ficam próximas ao caixa.
A elasticidade e a adaptatividade das xoxotas já comprovaram sua possibilidade de acesso a ambientes inflamáveis, infláveis, escorregadios e pontiagudos. Enfim, a xoxota no futuro fornecerá matéria prima para foguetes, caixas pretas e chicletes.
Portanto defendo também seu asseio completo, estrutural e emocional, para que ela execute fidedgnamente seus potenciais e assim auxiliar na salvação de nosso planeta. É claro, por meio salvação dos seres e suas próprias capacidades, potencializando suas execuções de encaixe e adaptação que culminam com o alcance do inteligível.

06 setembro, 2009

Frase do dia

" Trouxa raleia mas não acaba "

sabedoria popular rules!

05 setembro, 2009

Deixa lá

Ela atravessa minha rua
com duas cervejas nas mãos
me arrepia o estômago
a gente sabe o por quê
bebe minha tequila
entope meus ralos
deixa farelos na mesa
irrita meu gato
esquece o despertador
enquanto ronca
calma e profunda
deixa seu perfume
no ar como se fosse dela
a casa e a cama
deixa a si mesma
seis pratos
seus pedaços
seus rastros
seus trapos
seus passos
seus traços

na casa, no gato e no dono

03 setembro, 2009

tanto nem tanto

Antes o amor era bonito
Antes amor era forte
hoje a gente nem tanto

02 setembro, 2009

Um real

Nossa, uma nota de um real! Só se via moedas de um real por esses tempos. Uma nota. Marcou a infância de muita gente aquela notinha verde e foi triste trocar tudo por moeda, moeda enchendo carteira, enchendo a bolsa, enchendo o saco e tudo mais. E aquela nota era especial pra ele, mostraria ao neto. Há muito tempo o um real era de papel. Sério ? Não acredito. Era. Agora ele tinha encontrado uma nota de um real. Dia ganho. Nunca ganhar um real em um dia tinha sido tão bom. Mas na esquina da 1ª de Março com a Prudente de Moraes um rapaz magrelo apareceu e queria tudo. A carteira toda, o celular que ele não tinha e também o um real que ele tinha. Mas era de papel e não vale, ele não entendia. É tudo um real. Mas não vale mais, não vale nada. Passa mesmo assim, é pra passar tudo, véio. Ele queria conversar e salvar a nota pelo menos. O resto todo podia, sem problema. Era pelo neto, por favor. Não. Coisa de véio essa de juntar quinquilharia, passa tudo e cala a boca. Não, por favor.
Várias facadas no bucho, até que nunca mais se falou disso.

30 agosto, 2009

Epílogo (de Charles Bukowski)

Fante foi pra Hollywood,
Fante no campo de golfe,
Fante nas mesas de apostas,
Fante numa casa em Malibu,
Fante amigo de Wiiliam Saroyan.
Mas Fante, eu lembro de você melhor,
nos anos 30 morando naquele hotel perto do Angel´s Flight,
se esforçando pra ser um escritor,
mandando histórias e cartas pro Mencken.
O grito vinha dos colhões naquela época.
Eu ouvi.
Eu ainda ouço.
E eu me recuso a imaginar você
num campo de golfe ou em Hollywood.
Mas agora não importa.
Você está morto
mas a boa escrita continua
e o jeito como você me ajudou a escrever como eu queria.
Eu estou feliz de finalmente ter te conhecido
apesar de você estar morrendo
e me lembro de ter te perguntado
“escuta, John, o que afinal aconteceu
com aquele menina mexicana no Pergunte ao Pó?
E você respodeu “ela se revelou uma porra de uma lésbica!”
E aí a enfermeira veio com a sua grande pílula branca.


(John Fante é isso. Só lendo)

28 agosto, 2009

cuidado. a síndrome do homem babão* está solta. estou impressionada.
até eles. uma pena. eles eram legais.



* falta de requinte seletivo, ou excesso de embasbacamento.

27 agosto, 2009

Coração de pai não nega nada pra filho

(texto meu, Adaptado por Hilde Buzzá e Ricardo Piazza )

UMA MESA. UMA MULHER E UM HOMEM SENTADOS FRENTE A FRENTE.
ILUMINAÇÃO: UM ABAJUR.
O HOMEM ESTÁ MUITO INSEGURO, USA ÓCULOS E TEM APARÊNCIA FRÁGIL. APARÊNCIA DE PAI DE FAMÍLIA. OLHEIRAS. OMBROS CAÍDOS. TRANSPIRA E TREME.
A MULHER ESTÁ BASTANTE SEGURA, CALMA, PRÓXIMA.

Ele:
Não, eu juro que eu não sei nada.

Ela:
Olha só, tenta. eu sei que você vai conseguir.

Ele:
O que você quer que eu faça? Invente histórias, é isso que você quer?

Ela:
Não. Eu sei o quanto isso é difícil pra você. Sei o quanto é complicado relembrar algo que te faz sofrer tanto, mas a gente precisa estar juntos pra descobrir a verdade.

Ele:
Eu não lembro. Era uma noite normal. Não tinha algo especial que marcasse aquela noite. A não ser..

Ela:
Isso, fale mais sobre ela. Quem sabe isso clareia sua memória

Ele:
Eu não vou falar sobre eles, não é justo. Aqui?! Ele merece respeito.

Ela:
Merece sim, eu concordo. Merece nosso respeito, e... você não acha que descobrir a verdade é o mínimo de respeito que ele merece?

Ele:
Olha, eu não sei o que aconteceu. Eu estou sofrendo e ninguém respeita minha dor. Ninguém estava lá quando eu vi o caixão descendo pra terra. Você não estava lá, eles não estavam lá. Foi em mim a dor, em mim. Você já viu isso acontecer com a sua família?

Ela:
(séria)Eu nunca faria aquilo com a minha família.

Ele:
Como?

Ela:
(voltando pra intenção anterior)
Nada. Vamos pensar. Alguém que não gostasse dele. Ou de você.

Ele:
De mim?

Ela:
É, alguém que poderia se vingar.

Ele:
E você acha que eu colocaria ele em risco? Eu?

Ela:
Não intencionalmente, claro. Mas certas coisas escapam do nosso controle. É comum, às vezes você não teve culpa alguma.
Eu não sei! Eu não sei. Que tormento. Por que isso? Você já teve filhos? Já teve a sensação de ser responsável pela felicidade de alguém? Não, não teve. Você não sabe o que é esse amor. Eu sei o que é amar! Eu sei o que é sofrer por amor.

Ela:
Sei que você sabe como é. Sei que foi um bom pai durante a vida dele.

Ele:
Eu fiz meu papel

Ela:
Você fez seu papel. Eu realmente nunca tive filhos. Acho uma traição.

Ele:
Do que está falando?

Ela:
Uma traição a nós mesmos. À nossa dignidade entende? Quando a gente tem esse amor todo que você disse, a gente acaba fazendo coisas que não deveria, pela felicidade dele. Não é verdade?

Ele:
É.

Ela:
E...Ah... crianças. Essas criancinhas. Não medem nada, nada! Até matam por um pirulito, pode acreditar. Tudo. Sem medir conseqüência, eles não moram nesse mundo, o das conseqüências. Então fazem tudo, tudo pra conseguir o que querem. Manha, bico, choro, olhos cravados na gente, pronto pra matar. Prontos pra matar.

Ele:
É... criança é o bicho.

Ela:
Criança não é inofensiva não. É criança destruindo mãe: suga o corpo dela durante nove meses, a praguinha. Secando o corpo dela enquanto mama. Dissolvendo os pais, pouco a pouco, com sorrisinhos. Por todos os lados. Sorrisos, balas, doces e manhas.

Ele:
(tomando um ar mais forte, firme, tomando postura)
É, quase coisa do diabo. Como uma coisinha daquelas, uma coisinha só. Parece tão inocente. Com aquele olharzinho. Mentira que toda criança é doce.

Ela:
(ela começa a tomar tom insinuante)
Aquele olharzinho! De quem quer alguma coisa....

Ele:
(atormentado)
É! Aquele olharzinho...

Ela:
Aquele olhar de quem quer alguma coisa...

Ele:
Quer alguma coisa. Eu não gostava não, sabe. Estranho. Criança sem vergonha, sem vergonha. Falava: sai menino. Sai. Sou seu pai.

Ela:
Mas eles nunca ouvem. Fazem tudo outra vez. Sorrisos, doces, bala, manha, bico. Bico e aquele olhar dissimulado.

Ele:
Aquele olhar dissimulado.

Ela:
Querendo brincar: (imitando criança) me leva pra brincar??

Ele:
É!!!!

Ela:
(fazendo gestos sexuais)
Pulando no cavalinho. Pulando, pulando. E pai obedece. Coração de pai é mole!

Ele:
Coração de pai é mole.


( falas são ditas atropeladas, o homem torna-se animalesco e os dois representam um estupro)

Coração de pai não gosta de negar nada pro filho.

Coração de pai não gosta de negar nada pro filho.

Coração de pai não gosta de negar nada pro filho.

Coração de pai não gosta de negar nada pro filho.

Não gosta de negar nada pro filho.

Ela:
Pulando no cavalinho: pai. Vem comigo brincar, não era assim?

Ele:
Era! criança do demônio. Maldita, bandida, sem vergonha.

Ela:
E coração de pai não nega nada pro filho.

Ele:
E coração de pai não nega nada pro filho. E coração de pai não nega nada pro filho.
(agarra a mulher)
Não nega... Não nega...

(entram alguns homens, simulam uma “prisão” do homem. E ela grita enquanto ele sai)

Ela:
Você vai apodrecer aqui, seu filho de uma puta. Você vai apodrecer aqui.

26 agosto, 2009

ha

Quando longe manda beijinho e dá sorriso.
Quando perto dá um oi, tchauzinho ou nem isso.
Não me venha com histórias de eu mereço seu protesto.
Tá precisando aprender com o Jhonny
e sua cara de "oi, eu não presto"

19 agosto, 2009

O bom humor não é questão de bom amor.

17 agosto, 2009

Je veux plus

As vezes eu poderia ficar o tempo todo lendo. O tempo todo escrevendo e ouvindo os meus amores musicais. As vezes passar o tempo todo sozinha, as vezes o tempo todo com meus amores amigos. Já supus poder ficar o tempo todo só conversando com aquele cara. Acho que poderia ficar o tempo todo fazendo teatro. Ou o tempo todo bêbada. O tempo todo falando em público, quando eu perder o medo. O tempo todo aprendendo a ser mulher e mãe com a minha mãe. Poderia ficar o tempo todo correndo por aí de bicicleta, o tempo todo na frente do mar.

É que eu tenho um tanto de leitora, um tanto de amante de música, um tanto de tendência a solidão, um tanto de amante dos meus amigos, um tanto de carente, um tanto de sensualidade, um tanto de mulherzinha apaixonada, um tanto de artista, um tanto de porra louca, um tanto de filha e mãe.
E cada tanto é tanto que eu acabo querendo demais e pra sempre. Bem fundo e excessivo. E as coisas precisam ser fortes pra eu viver bem dentro desse corpo de pouca altura. Mas depois passa, eu passo uns tempos no quarto escuro ou no sol, e volto ao normal. Mas se volto é pra pedir um pouco mais.

13 agosto, 2009

Ao prólogo

Eu, filho, neto e irmão de médicos. O homem que foi feito pra ser médico, mas tornou-se ator e, segundo o "papai" um gay, viado, bicha, safado. E perdidamente apaixonado por Roberta, que fazia cover da Nina Simone em uma boate reprovável de Botucatu.
Apaixonei-me quando, depois de nove conhaques com guaraná, ele cantou "Don't let me be misunderstood". Nenhuma mulher seria tão feminina quanto aquele travesti naquele momento. E os nove conhaques que me fizeram apaixonar cresceram para dezessete e me fizeram amá-lo mais do que qualquer homem amou uma mulher. Ele tinha a boca fina, as pernas longas e os olhos enormes saltando da cara. Cílios postiços, peruca longa e um vestido azul muito brega, que o fazia mais sensual que a Monroe, aquela que forçava biquinho e empinava a bunda. Ele era o que toda mulher gostaria de ser. Ele era. Mas tinha esposa e gostava dela. Ela não merece você, com certeza não é metade do que você é. Mas ele ria e acendia o cigarro pós foda. Você é ciumento demais pra um homem, dizia. Depois vestia o vestido azul suado e ia pro camarim vestir-se de marido.

Ele não me amava porque eu o amava demais. Já a esposa lhe cuspia na cara porque pensava que nas noites fora ele ia ao bar com os amigos e se dava com outras mulheres. Ela nunca imaginaria que o cheiro de perfume feminino era dele, não nele.
Dormi três dias em frente a sua casa e descobri que a esposa era uma menina de dezessete anos e realmente não tinha metade da força e do brilho de Roberta. Não era meu ciúme doentio: ela era esdrúxula.

Naquele dia daquele tempo eu ainda achava que era só tesão. Pergunte então àquele conhaque que eu não esqueço o gosto, àquele vestido de lantejoulas azuis e às minhas seringas. Pergunte o que aconteceu e eles desenharão o nome de Roberta com a fumaça impregnante do cigarro dele, que por muitas vezes esteve em minhas roupas e pelo qual eu, por não saber quando o teria outra vez, ficava dias sem tomar banho. Pergunte à Nina como ela transformaria em música o amor que eu tinha por Roberta, e se alguma pessoa a não ser ele poderia cantá-la, mesmo que na imundice dos lugares em que sempre estava com seu vestido brega. Apesar da esposa tê-lo abandonado, apesar de ele não ter deixado de amá-la e continuar não me amando, apesar de hoje estar em uma asilo.

Talvez tenha sido por tudo isso que hoje eu pouco existo. Eu me quebrei em pedaços tão pequenos que nem Roberta conseguiria reconstruir. Reparti-os nos lugares onde realmente me senti vivo. Estão na cama, na mesa da boate e no armário que guardou os vestidos dele. E fiquei sem nada meu por que era desnecessário, para sempre e até agora, depois que se passa por uma paixão assim.

Roberta me deixou depois de dezessete trepadas e três passagens pela polícia.

10 agosto, 2009

Não fume aqui, baby

Não fume. Não em lugares fechados como: boates, banheiros e motéis, mas só se estiver acompanhado. Não fume depois de uma foda. Você está impossibilitado de fazer cara blasée com um cigarro na mão. Chupe um pirulito. Bata uma punheta mas não fume depois se estiver cercado de pessoas. Não intoxique o ar e o cabelo das pessoas, nem os pêlos pubianos de terceiros. Não fume cigarros acesos em público. Não goze na boca. Não fume na balada pra ficar charmoso. Não fume em locais fechados ou parcialmente fechados como bares, caixas de sapatos e as moças virgens de hoje em dia. Não fume o cigarro ao contrário. Não foda os pulmões e os cus alheios.

09 agosto, 2009

Da Clau: Uma historinha de amor

Ele era interessante, tímido e sério. Calmo. Daqueles caras que deixam a gente calma só de falar e rir. Mas tímido nem era tanto, a lábia foi boa e a gente ficou. E ficamos, ficamos. Ele sempre mostrando pro mundo que eu era dele, só dele. E eu adorava. Olhava pra mim sério e me arrancava do meio de qualquer foco de olhares. Gostei quando ele disse que gostava do Cabrel. Cabrel no rádio e fomos pra cama. O sexo era delicioso. Nem tão tímido! Nem tão sério. Depois do sexo ficava quietinho passando a mão na minha cintura. Mãos na cintura! Ah, meu bem, era tudo o que eu precisava agora. Mãos na cintura e o Cabrel cantando... doucement... pas vite.
E ele cantava bonito, voz gostosa. Pensei duas ou três vezes que eu tava feliz daquele jeito, tinha achado um amante, enfim. E quando isso acontece eu sou fiel. Amante. Apresentar pro mundo como namorado só fode qualquer coisa gostosa e feliz. Dá merda. A gente começa a cobrar só porque tem satisfações a dar pras pessoas. Então deve ser amante.
Um dia ele disse que seu futuro era viajar, adorei. Pensei: Aventuras, a gente pegando trilha e dormindo imundo numa barraca, passando frio no mato e calor numa praia deserta, nos alimentando de sal do mar e vódica. Depois ele disse que queria ganhar dinheiro, brochei. Tanta coisa boa pra fazer na vida e tu quer ganhar dinheiro? Brochei forte. Depois disse que queria viajar pra Alemanha, EUA e o caralho. Que guei! Porra, cara.
Uma pena, mas o negócio foi dar o fora dessa historinha de bosta.
Au revoir,
Clau

07 agosto, 2009

Comprar carros

ela - Olá
ele - Olá, a senhora precisa de ajuda?
ela - Gostaria de ver um carro.
ele - Temos vários muito bons aqui.
ela - Observei que vocês tem muitas coisas boas aqui. Como carros, por exemplo.
ele - A senhora quer me acompanhar?
ela - É claro que quero.
ele - Que cor prefere?
ela - Gosto de verde. Prata. E Azul da cor da sua camisa.
ele - Pois não. Temos aqueles pratas. Estes dois verdes e este azul.
ela -Sabe...Gosto de azul...
ele - Sim... Bem. Olha, este. Gosta de quatro portas?
ela -Prefiro quatro paredes.
ele - Quatro paredes?
ela -É. Como aquelas de delimitam um quarto. E gosto de quatro portas. E você?
ele -Ahm? Se eu gosto de quatro...
ela -Portas.
ele - Ah... sim.
ela -Gosto de coisas grandes também, como carros grandes.
ele - Ah, eu também. Veja este...
ela -Então quer ter uma família?
ele - Eu? Então, estou novo pra isso. Mas um dia, ?!
ela -Isso é uma proposta?
ele -Quê?
ela -Direção hidráulica?
ele - Estes aqui. Aquele, aquele e aquele.
ela -Posso ver o azul por dentro?
ele - Claro.
ela -O carro ou a camisa?
ele - Quê?
(tac. ela abre a porta do carro)
ela -Ah. É bonito! Vem comigo?
(ela dá uma piscadinha)
ele - Eu?
ela -É, pra ver se você fica bem. Quero dizer, quero ver se as pessoas ficam bem no carro.
ele - Ah, sim.
ela -Hum. Muito bonito. Seu corpo encaixou no carro, olha só. Mesmo sendo tão alto, costas tão largas e braços tão musculosos. Posso experimentar?
ele -Experimentar?
ela -O carro. Fazer aqueles tais testes drives?
ele - Claro!
ela -Você vem comigo?
ele - Sim, só um minuto.

ela -Olha só, as pessoas olhando pra nós neste carro azul. Acho que ficamos bonitos nele.
ele - Aham.
ela - Ou ficamos bem juntos... Esse caro enfrenta bem estrada?
ele - Sim, muito bem, ele é...
ela - E drive in?
ele - Quê?
ela - Estradas de terra?
ele - Ahm... Sim, ele tem tração nas...
ela - Bom. Então tá.
ela - Então, o que me diz?
ela - Eu digo que eu te amo.
ele - Ahm?
ela - Eu te amo.
ele - ...
ela - Ah. Mas o carro não vou levar não. Sem grana, sabe como é. Preciso antes estabilizar minha vida - (outra piscadinha) - Tchau tchau, delícia.

06 agosto, 2009

pessoas que são simpatississississississímas e interativas, queiram fazer o favor de morrer.
Grata.
- Querido, faz tempo que não fazemos sexo.
- Fale por você, gata.

05 agosto, 2009

Na prateleira

Segue a moça: cabelos amarelos quase brancos.
Seguindo o moço: cabelos lisos pretos até os ombros.
Eles não se gostam, eles nem se olham. Esbarram-se algumas vezes e dizem um "foi mal", da parte dela; e um "desculpaê", da parte dele. Eles são tão iguais que se sentiriam constrangidos, então, por obra dos astros -se é que eles existem- aquário não entra em vênus a não ser quando eles estão perdidos em algum lugar -ele num barzinho preto que toca hard metal, ela na rua Augusta- mas nunca quando estão perto um do outro. Por obra de vênus ou aquário ela se dá com alguns caras babacas e algumas ruivas. Ele com meninas cheias de piercings e tatuagens. Eles são iguais e não sabem. Se se notassem na rua nenhum teria interesse no outro -ele de sobretudo preto, ela de saias indianas- duas pessoas que foram feitas pra ter filhos.
Eles nunca vão se ver, nem ao menos vão notar. Nem ao menos vão se interessar quando um estiver lendo no ônibus - ele, Kafka. Ela, Caio Fernando Abreu. Ele vai passar o resto da vida com o preconceito de que Abreu é moderninho demais sem ter lido, ela não vai conhecer os absurdos Kafkanianos. Eles não vão ter a casa que foi feita na década de 50, sonho de ambos, e que está a venda faz quase cinco anos. Perfeita pra eles morarem com os filhos. A casa que seria cheia de redes, samambaias, insensos e posteres do Iron Maiden. Eles nem conhecerão a casinha que lhes esperou. Eles não vão passar a velhice juntos rindo das brigas que teriam por causa da alergia que ele tinha das margaridas dela e ela dos sustos com o som alto dele. Nem vão sonhar como seria de verdade o amor de suas vidas. Por que não se conheceram. Por que estavam muito rotulados - ele assim, ela daquele jeito.

04 agosto, 2009

ah, sim!

estava viajando de lá pra cá. comecei a viajar que estava viajando ao som de Triumvirat. tudo porque a música que se chamava "flashback" me fazia lembrar do futuro.

02 agosto, 2009

Bom dia, tristeza. O lugar é aquele, sente-se. Ao meu lado, comigo. Sejamos sós hoje.
Seja só hoje meu amigo.

Uma dose? Eu já sabia.

01 agosto, 2009

Qualquer coisa

Eu estava lá, parado e sentado. Ela chegou, tocou meu braço - desculpa daquele dia. Que bom, ela superou o "desculpa qualquer coisa". Sempre tinha uma qualquer coisa pra ela se desculpar. Mas só eu sabia quais eram os quaisqueres. Ela não, a imponente. Só eu conhecia o fundo, só eu. Eu, o impotente. Derretendo as lágrimas na mesa da cozinha enquanto esperava a menina voltar. Ela era um bebê quando olhei pra ela e soube que amor é sofrimento. Ela era só minha quando eu descobri que ela era do mundo inteiro. E eu, por mais pai que fosse, não poderia leva-la ao mundo segurando suas mãos como eu a levei à escola no primeiro dia de aula. A mãozinha dela cresceu e meus cabelos brancos também. E ela lá, toda menina ainda, mas ninguém via. Ninguém via - ele é gente boa, não esquenta- não esquento. Mentira. Olhos dissimulados, minha linda. Não é ciúmes de pai. Não era. Não era pra ser com você, não era pra ser com menina nenhuma porque o que eu sinto nenhum pai poderia. Doía seu - ah, quanta encanação... pára de pegar no meu pé - o mundo é tão grande, e as pessoas tão más. Mas se eu falasse assim você riria. Nunca li histórias pra você dormir, e esse palavreado te chatearia ou divertiria, dependendo do seu humor. Mas a sério você não levaria. Eu falava, falava. E secava... Eu sentado e parado. Achei que fosse você tocando meu braço mas não seria. Você só se desculpava por "qualquer coisa", minha menina. Esperança de pai que você crescesse mais no juízo do que no corpo que atraía aquele. Antes de tudo cheguei a pedir a Deus que você ficasse coxa pra que ele sumisse. Me arrependi depois. E depois de tudo pedi a Deus que ele definhasse - pai, olha só eu voando - você no balanço do parquinho, os cabelinhos cacheados no ar, pra lá e pra cá - pai, olha só se eu não sou desenhista - é sim, era sim, das melhores do mundo - olha lá, eu vou ser aeromoça, voar pra sempre - tão arriscado! ah, seja o que você quiser - então, to de bode hoje, não vou pra aula - e a dor começando, e a angústia chegando e tomando conta da casa e das suas bonecas abandonadas, gritantes, suplicantes pela menina que você foi. Ele chegando, você saindo, você chegando tarde. Ele sumido, você sumindo, você voltando bêbada, você cheirando mal, eu te dando banho enquanto você gritava comigo. Você drogada. E eu definhando. Ele sumido e você sumindo, você sendo tragada pelo mundo porque eu não te levei com as mãos dadas nas minhas. Minha menina. Eu andando a noite toda na chuva, você sumida. Pessoas drogadas, você sumida. Você voltando pra casa três dias depois toda roxa. Indo pro banho depois de pedir desculpa por qualquer coisa. Você de vestido rosa no dia do seu aniversário. Você rindo dos palhaços. Você toda roxa. Você andando até mim de braços abertos quando eu te dei um gato. Você caída no chão e não me reconhecendo. Você chorando por ele. Você bebendo. Você fumando. Você apagando o cigarro no sofá. Você apagando o cigarro na minha cara. Você, a minha menina - Pai, me leva no balanço- seus cabelos pra lá e pra cá. Minha menina. Voando 9 andares até chegar ao chão. Os cabelinhos cacheados no ar, seus piercings pelo ar, seus braços pelo ar. E eu. Eu. Sentado. Parado. Sumindo.
Definhando. Tocando seu braço - pai, olha eu voando.

26 julho, 2009

- ...

mudo da descrição e continuo sem descrever nada. Mudo os verbos e esqueço que vírgula não é pasto em fazenda. Tudo pára antes da hora e tá errado, eu sei. Tá errado. Não sei pra quê uso tantos pontos. Parece que penso em estanque. Erro, volto e erro outra vez, só que diferente. Começo uma nova frase sem sentir nada, e esperando falar algo. Mas conforme passa eu vejo que é impossível descrever sem o mínimo de sentimento, doação e abertura. Não tem como fugir do lugar comum quando se usa uma palavra depois da outra, intercalando as bonitas e as feias e separando-as com as vírgulas e os pontos. É permitido que seja podre ou que seja belo, mas acima disso é preciso que seja um parto, que saia das entranhas e que, como um bebê, não tenha medo do mundo ao qual veio. É preciso ter essa tal coragem inocente que tem os filhos da gente. Que nós mesmo tivemos por também termos sido. Nós éramos muito mais corajosos naquele tempo, quando éramos inocentes. E as palavras, juntas, são assim: corajosas quando inocentes. . Eu fiquei assim ultimamente. Esquecida do que me tinha trazido até aqui. Fui editando, editando e esquecendo qual era meu papel: o de ser livre. e não deixar que nenhum travessão me pusesse ponto final.

telégrafo

nega,
aqui também tá difícil. Não é só você que molha o travesseiro a noite. Não me esqueça, eu não te esqueço.

nega,
eu volto, juro que volto. faço de tudo. Quito minhas dívidas, gasto todo meu salário. Vivo pra ser seu. vivo pra ser minha.

nega,
saudade de cheirar seu cheiro. não se perca nesse mundo fedorento e sem amor. eles não sabem o que é fazer amor com você.

nega,
não fala assim comigo. Você sabe que sou só seu. Seu e só. Tô sozinho aqui, mas não vou perder o juízo. Nenhuma tem seus cabelos.

nega,
não faça assim comigo. você sabe que eu não presto mas sabe que eu te presto.

nega,
já te disse pra não ter crise. Pretinha, eu volto já. Você nem vai sentir o tempo passar e eu já tô aí. Aguenta que eu também aguento.

nega,
Hoje a gente faz tempos juntos. Quero mais. Quero o hoje mais do que ontem. E olha que nosso ontem foi o melhor que qualquer romance podia querer.

nega,
Hoje tá frio aqui. Dormir com seu cobertor e sua foto não valem nada pra quem já teve seu corpo do lado pra esquentar.

nega,
o frio daí é o frio daqui. Não sou eu o frio, como você pensa. Eu te quero, não esqueça

nega,
Mas falta tão pouco.

nega,
eu sei. Mas esse que parece ser muito, nem é tanto pra tanto desejo. O meu desejo. Tá chegando.

nega,
Tá chegando sim. Parei o trabalho. Menina minha, espera. Não me dê trabalho, não me desame.

nega,
Eu sei!. Quer saber de uma coisa, quase fui praí hoje. Tá difícil aguentar.

nega,
eu sei. Vou aguentar. Tá difícil nega. Fala pra eu ir, eu vou. Fala.

nega,
Você tem recebido meus recados?

nega,
nega...

nega,
me fala...

nega,

o que se faz

você chegou outra vez. pela segunda. de novo.
eu olhei, nada disse. tentei um gesto. tímido.
te chamei pra entrar. ofereci café. não? uma dose?
você sentou no meu sofá. ligou a tv. eu fiquei a te assistir.
outra vez! mais uma. as pessoas não mudam.
fiz o almoço. te chamei pra mesa. esqueci o sal.
você sempre tão doce. disse nada. mastigou e sorriu.
ah. que cabeça essa minha. bebe algo? suco? chá!
limpou os lábios enquanto eu lambia os meus. olhava os seus.
estava bom? bom. sempre bom. ah. as coisas não mudam.
pode ser que eu saia a tarde. tudo bem.
mentira. pra ver se você queria ou não
eu não soube entender sua cara. então, fiquei.
cara de lindo. ah. virando os olhos e piscando enquanto fala.
então eu fico. até a noite. janta aqui? ah, não sei... tímido!
ah... fica! ficou. o que você faz se não ceder a mim?
então eu faço tudo. com sal. açúcar e afeto. e chico no rádio.
faço a cama pra dois. só um travesseiro.
eu não esqueço. não te esqueço. tomo banho e vou pra cama fresca.
vou fresca. vou limpa.
não levo minhas marcas. aquelas. as suas. é pra ser do novo.
o que sou eu se não sua?

24 julho, 2009

as sete eu aos sete dias

são sete moças
todas eu cruas
divididas inteiras
desigualmente e nuas
às sete partes do corpo
sentam-se a beira do banco
à sarjeta
à rua

são comigo sete bolsos
moedas, papéis e palitos
papéis aguardam por mim,
mulheres e sete crianças guardam
me guardam
e outros papéis me gritam aflitos

são olhadas as sete moças
soam olhares e buzinas e alarmes
setessentas sem encantos
vidas moças tímidas vazias
que se espremem aos cantos

(chacoalham)

sete vezes as sete horas
em uma calçada pobre
uma rua suja e eu
a sua sétima e única sílaba
sã em sete notas musicais
a sua oníssona

são os sete dias sem cor
os sete gozos visuais


na calçada frente ao bar
às sete bebidas contra mim
e a sete belo a favor do hálito

somos sete aos sete dias

22 julho, 2009

e isto me tirou da crise existencialista de metida a escritora e tendenciosa a babaca:

"

(...)

- Que conselhos dá aos jovens escritores?

- Bebam, fodam e fumem muitos cigarros.

- E para os velhos escritores?

- Se o cara continua vivo, não precisa dos meus conselhos.

- Qual é o impulso que faz você fazer um poema?

- Que é que faz você dar uma cagada?

- Que acha de Reagan e o desemprego?

- Eu não penso em Reagan ou no desemprego. Tudo isso me enche o saco. Como vôos espaciais e o campeonato de basebol.

- Quais são suas preocupações, então?

- As mulheres modernas.

- Mulheres modernas?

- Elas não sabem se vestir. Usam uns sapatos pavorosos.

(...)".

de O grande poeta (Charles Bukowski)

21 julho, 2009

sobre confortabilidade de textos

os textos do Marcelo sempre fazem a gente pensar que está em casa, de roupa velha e com o pé na mesa de centro. E este é o melhor lugar do mundo.

19 julho, 2009

tá. isso não é um texto

Sintomas: pensamento compulsivo, romântico e dado a grandes tragédias. Imaginar-se com um cigarro na mão, escrevendo folhas e mais folhas de uma história cujos começo meio e fim já foram escolhidos. Certo anseio saudosista. Intensa paixão por coisas pequenas e corriqueiras. Olhar apurado para situações do dia-a-dia.

É falta de escrever.

Faz parte do tratamento.

Prossiga.

14 julho, 2009

SOLI


Soli tinha o rosto empoeirado e um corpo que se mexia como se o chão fosse macio, era um corpo lento e dançante: Era valsa, das lentas. O carteiro não lhe deixava cartas, o açougueiro nunca atendeu a algum pedido exigente de Soli. Nem os mendigos lhe pediam esmolas. Ela não tinha telhado, mas nem ao menos sabe disto porque não olha pra cima; ela não tem casa, nem família, nem beleza. Falar nela é tão singular que me dá vontade de fechar o quarto e deitar na cama escura.
Alguém cha...
Soli estava sempre sozinha mas, ambiguamente, acompanhava todos os que estavam como ela. Ensaiava um sorriso aos amigos... não, companheiros! Amigos não. Mas, enfim, ensaiava um sorriso à eles com muito custo. Gostava deles de verdade mas só sabia demonstrar com sorriso - elemento famoso dos mortais. Sabia que o sorriso finge simpatia, porém era necessária.
Alguém cha...
Só não olhou para trás porque estava tão lenta que seria preciso mais para atenta-la. A lentidão precisa de grandes acontecimentos para que seja interrompida, e a de Soli não era diferente. Falar nela me causa preguiça de falar. Escrever sobre ela me convence que os dedos são independentes uns dos outros, - ao menos eles acreditam ser - e é esse o quase mistério da escrita.
Não pense, meus caros, que Soli era triste, já que quem vive às condições dela acredita que sim. Poucos vêem o leve sorriso que Soli insistentemente ensaia porque ninguém gosta de ensaios, mesmo sendo o grande momento em que o humano demonstra mais fielmente suas limitações e habilidades. O ensaio é a tentativa despretenciosa que não temos maturidade pra entender.
Alguém cha...
Voltando à descrição chego a um pedido de desculpa pela desordem do texto. Soli era angulosa: ossos largos que pouca pele cobria. Dava ideia de que antes Soli era um esqueleto grande e forte e usou um pedaço de pele pra se vestir, ficando daquele jeito mesmo, como quem veste uma roupa apertada. Além de tudo sobrava onde não devia: suas bochechas caíam pelo maxilar, pele muito fina caindo, derramando tristemente no rosto, a única coisa que derramava pelo rosto dela.
Alguém cha...
Tudo "quase". Soli era muito atenciosa mas muito egocêntrica, sabe que ela ouvia tudo que se passava? Mas não se incomodava porque estava preocupada com seus anseios, sonhos e defeitos, e que a cada meia noite não saberia se aguentaria até as próximas seis da manhã.
Alguém cha...
Eu tinha tanto a dizer. Terminaria com um poema. Pensei até em um par de rimas bonitas. Mas a Soli vem até mim e eu acho por bem fechar a cortina e fazer silêncio ao mundo. É só assim que ela ouve seu nome sendo chamado com veemência. Um ponto de silencio no mundo. Um ponto só, meu quarto, sozinho, parado.
Alguém chamou

Foi engano.

12 julho, 2009

à Clarice Lispector, Virginia Woolf e Hilda Hilst

Um poema quase prosa cheio de sensibilidade. Uma sensibilidade obscena e incompleta, e por isso é pura cena real. Vida real reflexiva. Puro lance de cores e sensações que acontecem num cenário obscuro ao público, mas simples ao dono. Emoçoes concomitantes ao desenvolvimento de uma racionalidade temperamental, que cause uma certa violação degradante e excitante da carne dos olhos quando é lida.
É isso que quero. Uma prosa carnal regada de poema espiritual.


ps. É tão bom ter nascido mulher

11 julho, 2009

silêncio

eu quero o labirinto do silêncio. ele é a única verdadeira medida do espaço. ele é o único que transcende a mentira da distância.

10 julho, 2009

hai cai ?

a menina toca o rio
sente nos dedos
o que a flor sente ao frio

ex-maile

Feliz, felizmente assim
Seria bonito
seria poético
não fosse só
não fosse patético

09 julho, 2009

olhe a lua

Tem lua no céu
a
lu
a
olha
a
lu
a.
olha!
ela tá lá e você é só um mortal : v a d i o!
ha ha ha
o clima tá rindo de você, não vê?! olha so
a
lu
a
olha lá! sua besta de são jorge: tentando ver
a
lu
a.
olha. você não tem futuro. esqueça. desapareça.
seu mortal: v a d i o.
até o vento veio pra te despentear. ha ha ha. seu mortal. olha
a
lu
a.
olha lá. e ao voltar para o espelho. aquele que é um em um milhão.
aquele que se faz uno por si só - um caco de espelho é um espelho- ele
vai rir de você também, mesmo que o vento não tire a sustentação da imagem.
seu vadio
olha
a
lu
a

e junta

A gente meio que sempre assim: meio separado
Eu de roxo, você de amarelo
estranho, mas quando eu era criança achava que combinava
Aí você vem do lado esquerdo
eu do lado direito
o destino, baby, é a gente se encontrar
que clichê não? você não contava com minha astúcia.
Olha só. você é meu caso. Eu sou seu caso.
sem a gente, nenhum dos dois é real.
a gente esquenta nossa vida. Forno microondas biótico. biológico. foda-se
vem pra cama amore. tá frio
para todos os meus amores e ex amores


Foi tudo verdade.

francamente. isso não se faz

Erros, possíveis. Desculpas.
bêbada. outra vez. isso me faz pior que você? Engraçado. Meu braço "ex quebrado" dói. muito. Ex quebrado existe? Dói tanto. Deve existir.
E isso não me faz menor que vocês. Seus frescos.
Se eu faço o que eu faço. Tudo o que faço. Não julgue. Eu posso ter sua cura.
Apesar de não ter a cura para meu ex braço quebrado.
Dói

08 julho, 2009

na cozinha (2)

(texto refeito. com defeito)
ouça



Algo enche de você os cantos. Os meus e os do quarto onde te esperava. Alguma coisa faz você se expandir até o corredor, mas não tem. Então eu espero sem olhar pra lá pra não saber que falta algo.
Alguma coisa faltou antes ainda dos dias e noites na cozinha. mas faltou de corpo presente. o corpo que saia pelo corredor.
Eu ficava ali todos os momentos: dias e noites. Se é que assim se divide uma vida toda. Se assim é que se dividem os momentos de euforia e depressão.
Ficava a ouvir o barulho do relógio: tic tac. tic tac. tic tac.
quando você aparecia. tic... ... ... tic... tac...
Neste descompasso, para tentar que sua passagem fosse mais rápida eu aliava o barulho dos ponteiros aos seus sons. Tic, passo pé direito, tac, passo pé esquerdo, tic, arrasta a, tac, cadeira, tic, pega o jornal, tac, vira, tac, a, tic, folha.
minha música mais sofrida, mais doída, mais lamentada, e mais necessária.
Quantos mais compassos "tic tac" entre uma virada e outra de jornal, eu sabia o que você lia. Menos tic tacs significava caderno de esportes. Mais tic tacs, caderno de política. Quando a música era lenta eu imaginava seu semblante calmo. Ao contrário, algo teria dado errado no seu dia.
na sua falta o compasso do relógio prossegue o tormento. Eu não sei fazer música, ela é sua. Então você saía. passava pelo corredor. eu deitava na cama com os olhos fechados. Meus olhos tinham medo de você e sempre se fechavam quando você passava pelo corredor. à minha porta.
Quis chamar sua atenção e então acendi uma vela no quarto. Pela interrupção da música acredito que você tenha visto o brilho da vela, incomum, na parede do corredor, à frente do meu quarto. Era o momento. Tornaria a tocar com você a música compassada pelo relógio.
Quando ouvi o barulho do jornal se fechar, apaguei a vela. deitei.
Dei conta que participei da sua música.
Seus passos. foi incontrolável meus olhos se fecharem.
Você parou frente à porta. no corredor.
Tic. Tac. Tic. Tac.
Tic.
Tac.
Tic.
Tac.
Tic.
Tac.
Tic.
Viu que eu dormia e foi embora.
Malditos olhos humildes, rebaixados à sua presença. Malditos.
Abro-os.
Tic. Tac.
Escorre uma lágrima sem som.
Tic. Tac.
Nossa música acabou muda, com o maestro e seus braços no ar. Escorrendo. Molhando a partitura e o travesseiro.
Tic. Tac.
Tic.
Tac.
Depois disso fiquei na cozinha. Ensaiando sons. Feios. feitos de falta.
O corredor continuava vazio.
prosseguia sem som
Foi ruim, mas depois que eu aprendi a conviver com a cozinha o corredor não assusta tanto.
Eu vi quando você deu as caras no quarto, mas eu não quis tirar o encanto. no quarto não é lugar de se estar. vir pra quê? música mal ensaiada, improvisada. imprevista.
Vai pra sala que eu te dou um vinho e a gente dança um tango. A gente flerta, depois cada um volta pro seu cômodo. Eu não me incomodo. Mas essa sua mania de levar as coisas a sério...Você pode encher os cantos, mas o centro não. você não é tanto sem minha paixão ignorante. Você tá no canto e o centro é meu. Ah o centro. o centro sou eu no centro na cozinha olhando o corredor.

ao que foi longo ou tarde que já era longe

Cara, você sabe o que é sentir uma ansiedade enorme só por saber que amanhã talvez seja o dia em que você aparecerá do nada, sem nada ter sido marcado, e sorrindo vai me chamar pra uma cerveja. Não. Você não sabe. Você nunca sabe o que se passa por dentro dos meus olhos impassíveis. Você não sabe que por dentro de toda essa dureza se esconde o ser humano mais passional que você já pôde conhecer. Você não sabe. E é melhor que continue assim, pra eu acreditar que está tudo sob meu controle.
Mas não está.
Eu subo pelas paredes sim, por incrível que pareça, quando você ri. Love me two times baby... Eu me orgulho de ter te evitado, porque sou egoísta e te quero pra mim como o perfeito intocável. É a mania do ser humano de sofrer: o sofrimento pelo aumento do prazer. Eu prefiro não te tocar pra que você continue com o posto de "a única pessoa por quem eu me apaixonaria, se eu quisesse". E eu não quis. Ou quis, mas não me avisei para manter o charme.
Não aquele charme que você disse ter visto no meu olhar perdido. Você me ofereceu uma cerveja pelos meus pensamentos, lembra? Filho da puta, desgraçado e maravilhoso. Eu pensava em como a vida pode ser tão vadia por me trazer algo tão delicioso, imprevisível e improvável.
Foi aí que eu me convenci de minha passionalidade.
Mas era tarde.
Era tarde quando você bateu em minha porta com uma sacola nas mãos e olhar de "já é tarde?". Mas nunca é quando se espera tanto. Eu não soube o que fazer. Então tudo foi normal: as deliciosas conversas teóricas infinitas, você sentado de frente pra mim apontando coisas no ar enquanto eu olhava sua boca que se mexia. E eu sentia quando você fazia o mesmo e seu olhar rodopiava escorregadio pelo meu rosto e meus gestos.
Certas vezes eu me senti uma sombra do que você falava - minha cabeça vagando devagar entre suas vírgulas. Mas quando abro a boca não é para te impressionar. Eu me orgulho da minha inteligência quando estou com você. Eu me orgulho da minha incapacidade de dar um passo para perto de você. Eu me orgulho de me sentir tão virgem. Mas eu não sou.
Não tento ser.
Seu filho de uma grande puta.
Foda-se você e seu amor pelas coisas. Foda-se se você mostra o dedo do meio pra mim com o sorriso mais lindo que já vi. Foda-se sua leveza ao andar, ao falar e ao fazer: parece que você se movimenta com o vento. Foda-se! Você nem é grande coisa. Você está sempre no "lugar" comum. Um objeto comum.
Como os momentos podem ser tão especiais?
Eu contribuo com isso? Diz que sim, por favor. Satisfaça meu hedonismo que tanto me afasta dessas paixões ridículas. Por isso eu optei por dormir sozinha mesmo estando ao seu lado. Eu não quero estragar a gente.
Entende.
Me entende.
E depois me explica.
Isso tudo é tão "coisa" que me tira o humor. Me tira o romantismo. Porque o que mais me tira o romantismo é a paixão, que é um trago num conhaque: quente, forte e ardido. Com direito a careta e uma raiva contida. Um estresse pessoal. Um mergulho no interior do campo mais indiretamente pessoal. Eu contra mim. Eu contra você. E você contra mim. E nós dois contra o tempo e uma semana que não passa. Quanta guerra por pouca coisa: eu vou dormir sozinha sim. Desculpe, isso é o mais visceral que eu consigo ser.
É divertido.
Isso me diverte.
Divirta-se também.
Desgraçado. Seu rosto fica bonito de manhã. E minhas mãos diziam para meus olhos: Love me two times,One for tomorrow, One just for today. Grandissíssimo maravilhoso. Vai pro inferno você com sua inteligência. Vá a merda você com sua voz deleitosa. Foda-se seu poema. Dane-se sua sensibilidade e sua macheza que juntos me excitam. Vá embora e não volte com aquele olhar de quem esqueceu algo.
A cachaça está na geladeira.
Como já aconteceu um milhão de vezes.
O insuficiente para ensinar e aprender alguma coisa, quando se trata de mim.
O insuficiente pra me fazer compreender o que se passou e o que se passará, por se tratar de você.
Vai doer. Love me two times. Im goin away. Ao menos seja doce e lento.

05 julho, 2009

nademos ao nada

imagine uma piscina de bolinhas de sabão e você, áspero como um humano, todo cauteloso ao mergulhar nela.

puro frisson de prazer.

A.

Pergunte a A. se ela alguma vez se perguntou a respeito dos coelhos. Ela não. Ela só "viu" e sentiu. Ela soube sentir o que todos julgam tão errado. Ora, ora, cavalheiros deste tribunal. Tantas palavras eloquentes que ecoam em vossas cabeças nem ao menos vibram os tímpanos de A.
Ela sente muito por vocês e este sentimento é verdadeiro. Apesar de vocês julgarem-na, apontarem-na e falarem a respeito dela certas coisas que homens de bem não devem falar. Ela sobressai-se entre suas cabeças porque suas cabeças são pisáveis para que se obtenha este fim. É por bem que vocês as abram, mas vocês ainda não têm maturidade para tanto, excelentíssimos senhores deste tribunal.

Sobre a incompletabilidade

Tem tanto rascunho.
rascunho é texto?
ou um quase texto?
será que existe quase texto?
ou é quase um quase buraco, uma quase grávida. Texto é ou não é?
Tou desacreditando da incompletabilidade de textos. Eles já são o que deveriam ser na cabeça de quem escreve.
Se, aparentemente, não terminaram era porque queriam dizer: não precisa dizer mais nada. pensa aí.
Tanto para quem lê quanto para quem escreve.
Um quase texto é só uma vontade que esqueceu de almoçar e dormir.

02 julho, 2009

Os mil martírios de Sebastião (2)

S. S. dizia só as siglas do nome porque achava o próprio, o nome, muito intrínseco e especial para ser conhecido por qualquer um. Se soubesse seu nome saberia demais sobre ele - o que o jogaria ao caminho contrário à salvação.
Levava uma mala e seu próprio corpo. O mais pesado era o corpo. O mais sujo e mal cheiroso. Era o corpo. A mala era a sua redenção, sua entrega ao hedonismo.

Escrevia cartas sem saber a quem. Escrevia poemas sem saber de quem: dele não era. Mas era por suas mão que se fazia, o que dava a ele um certo posicionamento divino, espiritual. Cantava músicas infantis e atraía o olhar das crianças na rua - e ao atrair-lhes o olhar era que ocorria a repulsa delas por ele.
Nunca ficava o dia todo em casa. Gostava dos dias de sol e do parquinho ao lado da igreja da cidade. Todas as manhãs acordava e tomava leite com água e café, pra economizar. Pão com pão, como dizia seu pai aos filhos quando protestavam pela falta de manteiga: Pão com pão, tudo que um macho precisa.

Limpava a mesinha da cozinha, arrumava o jarro de água e saía limpando os dentes com a língua.
Ajoelhava no oratório da igrejinha e ao olhar para os olhos de Maria ficava com pena da cobra debaixo dos pés dela. A personificação feminina: olhos amorosos e nenhuma dor nos pés. Nem importava se o que seu pé pisasse era o capeta.
O diabo não trata com as mulheres porque elas vendem a alma e não entregam. Ou entregam mas tomam de volta depois. Ele ama as mulheres porque sabe que a dissimulação delas é culpa do coração mole delas. Elas sempre têm que voltar atrás porque o amor é amigo da inocência e ambas levam a pessoa a seguir pro lado que não deve. Ou deve, mas sem ninguém precisar saber.

Ele olha para as velas acesas no altar e duvida que aquilo ilumina a vida de alguém. Nem dos pecadores nem dos santos. Malemá da igreja, que tem dinheiro para pagar a conta de luz. Talvez fosse pra fazer os devotos associarem a pobreza deles, que os fazia precisar de velas todas as noites, à necessidade de rezar mais, mais, mais e mais. E salvos, não precisariam de luz. Nem do dinheiro pra pagar a luz. E ajudariam no dízimo. O dízimo para pagar a conta de luz da igreja, que não precisa de luz porque tem velas. O dinheiro sobra e... dá pra comprar castiçais de ouro. Mas ele não os rouba porque é pecado.

Com mais paz no coração saía para a praça tomar sorvete. Paga sorvetes para as crianças que tem coragem de se aproximar para pedir. Fica até as dez e meia, que é o momento que a manhã fica mais linda. Também é bom matar neste horário porque o sangue fica bonito.
Ao voltar para a casa trazia flores para o jarro da cozinha.

26 junho, 2009

- Sabe, aquele dia que eu cheguei
- Sei. Com cara de gente que esqueceu alguma coisa
- E você tava saindo da casa pra trabalhar. Eu tinha esquecido...
- Era a blusa, né?
- Primeiro esqueci o que falar. Esqueci palavras. Era sua cara. Sua espera.
- Depois falou que era a blusa e foi embora.
- Foi.
- Então volta.
- Quem sabe né?
- Enquanto isso...
- Enquanto isso você continua alugando todo mundo. Trepando com todo mundo. Mas eu volto.
- Acabaram as fichas.
- Um beijo
- Beijo

do exame de

Quando nasce é imortal. É lindo. Maravilhoso. E a delícia que ele despende é perder a própria inocência. E por perde-la ele se torna dilatadamente mortal.

lá fora

Hoje foi tentador declarar um feriado pessoal.

25 junho, 2009

é só o reflexo do que está acontecendo.

minha cabeça pesa o tanto do ar. é leve. é assim. no fundo no fundo tem uma coisa de poema. aquele depois do estresse. o maravilhoso. o divino. a sensação que fica sem levar ninguém. é o que encanta.
e canta. e canta.
meu corpo tem o brilho da luz. poeta. poema. poetinha. sana com o que vem de terra. desintegra. entrega. devora. o que faz com o fósforo. o isqueiro. o cinzeiro. o que é por ser cômodo. é só reflexo. é o que transfere.
e fere. e fere.

21 junho, 2009

desescognitivamente falando

- Triumvirat me deixa mais inteligente. Beethoven também. Talvez Saramago...
-Quem sabe o teatro?
-Sim.
-Vem de você ou deles?
-Sei lá. Cérebro trabalhando. Fervendo. Os dois. Dizem que a cognição
-Processo de... como chama mesmo? quando atrapalha, desestabiliza.
-É.. como chama?
-Errei uma questão na prova por causa disso.
-Piaget.. ou Vygotsky? Quem era mesmo?
-Só lembro direito do Skynner. Aquele filho da puta me condicionou!
-Então. As ... essas coisas todas, entende? Atrapalham a cognição. Aí a gente fica inteligente e
-Mas nem faz muito sentido ?
-Mas funciona com criança
-Mas criança é bicho inteligente. Aprende assim mesmo. A gente não. Se se atrapalha, fode
-Nossa. Que chato. Será?
-Sério.
-Mas todos esses estudos. Comé que eles ensinam do EJA? Devem ser teorias
-Ahm... verdade... ensino de adultos. Será?
-Mas... Como é adulto, deve acontecer só o processo de acomodação de informações.
-Só acomodação?
-É, por isso que a gente é vagabundo!
-...
-Foi mal.
-Você sabe que eu me importo com essas coisas. Ensino, aprendizagem. Ensinagem.
-Enfadonho. Sabe que eu andei pensando sobre isso.. que
-Desencana
-...
-Vai lá.
-Eu andei pensando... imagina se tudo que a gente aprendesse viesse das nossas experiências? Tipo, uma sociedade hippie!
-Isso já
-Perae. Uma sociedade hippie onde todo mundo ia aprender por causa da própria experiência. A gente não ia ser acomodado a aprender a ciência já feita- ou inventada né?- ia fazendo a ciência!
-Muito bonito mas é que
-Muito legal! Cara, vou difundir isso. Ia ser perfeito porque
-Isso já existe, e é uma teoria TAMBÉM! Mas sem essa de sociedade hippie. Comer mandioca e fazer sexo demais não dá inteligência suficiente pra "fazer ciência"
-Poxa... Será?
-Sério
-Tá bom. Mas...Que foda.
-Foda.

20 junho, 2009

ele disse: "ê Nádia. Pára de escrever putaria!"

Respeitem meus cabelos vermelhos

Começa com um começo não indeciso, eu assim: olhando o espelho olhar meus olhos logo acima da boca entreaberta, pronta pra te falar: eu vou embora. eu não presto. eu vim pra te dar seu sentido. eu vim pra você se odiar.
Uma piscada de olhos na cara de quem desgraçou algo bom. Os lábios se encostam num sorriso que pareceria tímido, não fosse safado.
E antes de sair, um beijo doce precede um tapa na cara. Viro o rosto e te faço chover meus cabelos. Seu rabo foi quente por um tempo, gata... Mas sou mulher que gosta do frio.
Adeus baby, foi bom porque poderia ser melhor. Agora é a última vez que faço isso, ao menos até que o dia acabe.

(da Clau?)

19 junho, 2009

Ela

Quando ela dança, alerta, alarde, alcança
Ela chega a todo pote de ouro, do lado outro daquele lugar
Ela gira, gira sendo outra, do outro lado e ainda me lança
Denso e morno todo, morto por estar tanto, e só

Porque naquela dança embolada, ela espalha cor, luz e areia
Entra nos meus olhos, camufla, congela, surta e sapateia
Na minha cabeça, no corpo pele e na boca
o gosto da fruta, o laço de lança dela, a louca

(...)

16 junho, 2009

mono diálogo

- !!
- ...
- ... !!!!!!!!!
- ...
- ?!?!
- ...
- !!!!
- ...
- &*!!!
- ...
- !
- ...
- ...

( Um não tinha que dizer. Outro não tinha o que dizer)

14 junho, 2009

antes de dormir

só faço possível sentir o melhor gosto da solidão quando lembro que não sou sozinha

13 junho, 2009

antes que termine

(ao som de Les Enfants de Yann Tiersen - On Tour DVD)

antes que termine
escuta
tem pedra na sua solidão
onde não quero tropeçar

antes que eu saia
me fala
tem pedestal no meu chão
onde você não quis pisar

a gente vai discutir,
brigar
jogar garrafas no chão
e ninguém vai tropeçar,
porque cortamos os pés nos cacos.

e no fim
os dois corpos
os dois pés
os pedestais
as pedras
o sangue
e os outros dois pés
e os copos
e uma garrafa
vão pra cama
chamar a embriaguez
com um sussurro

e no resto da noite
pedidos
risadas
choros
gritos
sussurros
e a calma

e mais...

tem yann tiersen no rádio
embalando dois corpos
dois copos
uma garrafa
e uma vontade de ficar

mas

que só vai durar
até a hora de colocar
em seus devidos lugares
os pedestais
as pedras

apesar
do devido lugar
dos corpos
ser a cama

12 junho, 2009

feliz dia do mais famoso, mascarado e rentável contrato entre pessoas!

11 junho, 2009

Os mil martírios de Sebastião

(texto em fase de mudanças)

Feitos de sangue e frio, o frio da rua : vai de fora pra dentro. Feito de inocência, suor e frieza. A frieza que vai do tal do coração pra fora.

Feito da outra, feito de vida com um pouco de sal. Feito de pus, dor e anestesia. Feito de massa que cresceu com o tempo entre o osso e a pele. Feito de ferro, aço e gasolina. E fogo. De pobreza e de riqueza volúvel. Feito Sebastião, que não era um assassino. Era um salvador de quem não sabia viver.

Feito assim, andou três dias pra conversar com o tal que daria à ele algumas ferramentas de trabalho. O velho tinha cara seca e voz macia. Era confuso. Talvez por isso ninguém gostasse nem desgostasse dele. Ele só estava ali. Ele só existia. Ninguém desgostava dele porque não sabia a verdade do que ele era. Mas se soubessem, os racionais nem assim o desgostariam. Não era por maldade, era porque se importava com aquele lugar.

E o Sebastião entrou na salinha escura com a cabeça erguida, por medo. É interessante ver que gente de personalidade também sente medo. E por isso ergue mais a cabeça. Grita quando não tem o que falar. Então, olhou na cara do velho de voz macia e quis se mostrar forte e pronto pro trabalho. Mas o velho disse que não era de sola que se chegaria ao lugar que ele queria : era preciso ter voz macia e uma imagem de quem só existe e não é grande coisa.
O velho até que sabia das coisas.

Procurou na mesma cidade um outro. Estranhou ser um moleque. Vinte e cinco? Com um cinto de couro e um olhar de quem sabe das coisas. Exatamente por isso Sebastião soube que o moleque não sabia nada.

Andou mais dois dias para procurar um outro que poderia ajudar. Ao chegar viu uma mulher amamentando uma criança suja. Ela tinha gordura no avental e um pouco de farinha no cabelo. Pela figurativa expressão de Sebastião, a mulher descobriu o que ele queria sem fazer perguntas. Ela disse para ele não olhar daquele modo porque caridade e pena é pura promiscuidade.
Sebastião sentou e tomou o café extremamente doce da mulher. Lembrava a avó dele. Não a mulher, mas o café dela. Quando o café acabou ele percebeu o cheiro de mofo misturado com mijo de criança e gordura, oléo... não sabe. Aquele cheiro era tanto que pesava no ar. Ele sentia os ombros caindo, a respiração difícil e os pés colando no chão. Será que não era visível que ele passava mal? Nenhuma fresta, nenhum espaço de ar. Nenhum lugar pra correr antes de ter a conversa que lhe interessava. Só os olhos corriam na cara parada de Sebastião, procurando um espaço menos fedido naquela gaiola sem frestas.

A mulher não perguntou nada. Deu à ele as ferramentas e falou : a única coisa que te digo dessa merda toda é que cê tem que saber pra onde vai. E não vai adiantar mudar o caminho - ela falava com os olhos tão cravados que o fazia sentir vergonha - Pensando isso cê não vai maricar no meio do caminho. Se pensar muito, perde a ida. Se esquecer, perde a volta. Agora vá.

Tudo pesava tanto que ao sair da casa sentiu que voava. O ar era outra vez leve e sem cheiro. Era, enfim, ar. Sentiu que cairia de joelhos na terra mas se esforçou para andar até que a mulher não pudesse vê-lo pela janela. Que janela? pensou. Não tinha. Mesmo assim não queria correr o risco. E andou, andou, andou. Caiu por terra, em cima da mala das ferramentas. A dor os joelhos que bateram no chão não era nem um terço da dor que sentia dentro da casa. Ficou ali abraçado com a mala, como a mulher abraçava a criança suja do colo. Quando sentiu que sua carne voltou a aceitar o ar puro, levantou e foi embora. Se pensasse muito perderia a ida.
E Sebastião foi.