24 outubro, 2012

que chico perdoe ou foda


Eu traço sampa a louvor até bem tarde
e tenho muito dono sem mente sã
estudo a porrinharia da maldade
que abate
atestando a mesquinharia vã

Ainda calada sinto que difamam:
"a máquina começa a definhar"
o pânico conforma nossa lama
estranha
o grande inferno popular

no solo dessa viva terra inteira
incorporo o sofrimento da nação
eu trato sampa a horror na algibeira
porque não posso mudar tua opinião

não sei se desgostosos se repartem
dizendo-se dessa merda grande fã
eu traço sampa e louvor em grande parte
e guardo medo do grande irmão

15 outubro, 2012

uma homenagem

Te conheci quando você ainda sustentava uma aparência de pessoa interessante. Rabiscava em seu caderno rosa e batia o lápis no queixo com ar professoral enquanto eu, sem tomar banho e no escuro, achava que nunca chegaria lá, que seria impossível competir minha imagem inteira com sua sombra porque até a sua sombra sem lápis e sem caderno rosa me assustavam. Aos poucos limpei meu corpo e você, depois daquele toco do Paulo, se sujou toda, perdeu o lápis e usou as folhas rosas pra tentar infinitos frustrados aviõezinhos. Segurava o avião torto entre os dedos e se jogava. Jogava-se mas não voava. Batia corpo no chão em barulho oco, tomatístico, e eu fui tomando forma, conteúdo e corpo. Quando menos esperava eu já te ajudava a levantar. Orgulhosa tomei forma de gente porque descobri o valor de ajudar que a nossa merda de raça sempre precisa pra ser gente. Te dei goles, comes e conselhos. Você não via nem ouvia, mas eu, caridosa, crescia. Pendurei minha foto no seu mural, tirei fotos com você pra colocar em redes sociais, disse como estávamos felizes no shopping, você não curtiu. Parou de falar e comer, queria o Paulo e só o Paulo te daria uma razão. Dormia o dia inteiro e achei por bem, caridosa que sou, limpar aquele quarto imundo que ninguém entrava por causa das baratas. Foi cruel. Mas o dever cumprido rendeu uma noite de vinho argentino que você não tomou. Foi pro quarto e lá está, junto ao seu lápis e a capa de seu caderno rosa que enquadrei e preguei na parede frente a sua cama. Até hoje me pega a lembrança da pessoa maravilhosa que você foi, que tanto me ajudou a ser e pela qual hoje tenho sido dia a dia mais. Todos os dias publico, como agora, uma homenagem plácida a sua pessoa, destruída pelo tirano Paulo que não soube entender, amar e ajudar alguém com tamanha alma vibrante como a sua. Sei que ainda lê, então quero que saiba que

06 outubro, 2012

é preciso, antes, precisar

Desesperadas paredes da cidade libertam. Os muros desse lugar meio sujo limpo alfinetam o desejo incansável do homem por beleza mas também se amolecem com nossas cores e formas. Tijolos e concretos pintados cedem lugar ao respiro da arte. Ruas que se combinam em cinzas a ton sur ton, placas vermelhas e faixas amarelas - para que paremos, tenhamos cuidado e estacionemos - abrem-se ao rosa laranja lima. Avisados estamos por todos os lados. Avistados não. Por isso cores e formas rosa laranja lima gritam que seja proibido estacionar e não ver que as faixas amarelas ficam dia a dia mais estreitas. Somos a multidão ocre apressada, tropeçante em tantas placas faixas out dores, separados por arestas e vértices porque curva gasta tempo: o mais perto entre dois pontos ainda é a reta, dizem. Por isso quanto mais arestas e muros e cinzas mais pintamos, mais curvamos linhas em muros telas alternativas, mais pulam poesias insinuadas. Que bem situadas estão, porque é preciso precisar de poesia.

30 setembro, 2012

ele não volta há tempos

Será que me escuta? Olá! Lembro de você. Ainda escuta? Mandei recado. Nada. As fichas acabam. Até quando poderei contar com você e sua sacola de cervejas velhas? Adeus.
Adeus?

25 setembro, 2012

um ponto

A história tão batida e contada emocionou pela primeira vez de verdade a moça. Foi quando viu que a moça da história era tão moça quanto ela e, como poderia não ter feito isso antes?, se colocou no lugar dela e sentiu muito. Sentiu tanto que fora de hora chorou. Chorou ridícula porque, ciente do vexame que passava, derrubou as moedas no chão para no chão poder derrubar uma gota dos olhos. Escorreu catarro e ela tentou esconder. Não adiantava mais, moça: vocês já eram uma só e por uma seriam ridicularizadas nas próximas contações do conto aumentado em um ponto.
um ponto irônico, pelo menos.

de semelhança

Vida seca. Seca como as vidas. Seca. Ventou terra, areia, perfumes e baratchos, mas a secura continuava insuportável. Porque eu gosto e preciso da água. Sofro com a seca como pouca e muita gente. Água é que nem sentimento. Vive em movimento, depende do tanto que é pra limpar ou devastar. Em queda é vento úmido, chega pra todo mundo que se arrisca a sair do casulo de medo e tomar toda água martelando na cabeça. E o som. Mil sons são. Uma sinfonia de gotas. Corpo na água até muda o ritmo, fica mais bonito, eu acho. É o mais próximo da sensação de voar. Quanto mais funda for a água, mais voando o corpo sente. Se manter flutuando é que é difícil. Cansa. Perde fôlego. Morte por água é triste também, um sufoco que só. Ninguém quer morrer de água. Mas como encanta.

18 setembro, 2012

de dá dó

Eu tava mar, miúda. De moiá as toaia de casa no choro. Tava de zóio firme no nada, tudo se acabada. Triste que só, triste de da dó. Tava que tava um assum, assim, triste de causa nium. A Zirda orviu, veio e deu broa: doce é bão e levanta difunto, falo a Zirda gorda, Zirda boa. O choro num tem causa de que, Zirda. É paúra do mundo. Zirda ri, Zirda caçoa. Zirda má, Zirda a toa. Num intende tristeza que dá do nada, diz que tristeza é mar de patrão. Ela falo tamém que tanque chei de ropa  pa lavá resorve.
Num resorve, Zirda, num resorve. Só faiz sargá a goma.

16 setembro, 2012

mexe


o corpo imagens espera. eufórico, um cisco que seja, um tento que tenha, uma foto cena fato azul arara
Da imagem pra dança é sinapse
ideias cruzadas eclipse
dança
sóis bichos vozes
Dissonantes, Antíteses
rebentado, se vê debochar o gestus anti homem trivial
corpo dança em roda, dança que solta, não molda, tudo se mexe em si por dentro e em si por volta

04 setembro, 2012

branco


Buraco branco
ser o que se quer
Um vazio e tanto

27 agosto, 2012

Cidade da sua cara amanhecida


A cidade fica tão bonita daqui, olhada pela sua cara amanhecida em plena cinco da tarde. Pego o café, sem bolachas, estamos quites sem mais nem menos e eu lembro como é bom sentir desse jeito.  A cidade assim longe parece um exemplo de esperança. você e sua mania de me acordar pra vida perguntam o que então eu tenho feito para. Eu solto aquela risada de é verdade, cê tá certo, cê sabe das coisas.  Vejo outra vez que sou ar demais, flexível, incoerente. É que eu não gosto dessa pobreza de espírito, dessa mania humana de se colocar de qualquer forma, até a feia. Você se vira com cara de novela mexicana e diz “ e sobre mim”. De você até que gosto. Só um pouquinho. Assim como digo que pouco gosto da cidade, voumembora, chamo de feia, suja, breve, mentira, enquanto meus olhos e todas as minhas vontades passeiam pelas ruas dela que é o exemplo prático arquitetônico de nossas subjetividades. me calo na Billie Holliday que canta uma e outra - o café esfria e gruda todo na xícara porque fica dias ali no canto da cama. Assim você também se coloca nas coisas daqui, ainda que da forma feia. De longe é poético porque na solidão ela me olha suja com ar patético. é assim, cidade de longe, ar de esperança, ruas e mais ruas que nos engolem a sós. A sombra da calçada muda do lado de lá pro de cá todo dia, meu bem, por isso a gente não cansa.

13 agosto, 2012

Acontece

Tenho dó de nós dois tão separados. A pele não aguenta, fermenta, enrijece. Mas amanhã é dia de cão, trabalho, ação no mundo que enobrece. Consolo de corpo separado é união de ideal, acontece.

08 agosto, 2012

rua Alexandrina


Em São Carlos, o poeta da rua Alexandrina escreveu em alto e bom tom “ouvi dizer que só era triste quem queria”.

Quem diria. Esse poeta da rua Alexandrina!

O poeta falou, em tinta preta esguichada em partículas,
de macro sentimentos
mais que muitas poesias editadas em imagens e películas

Quem diria o poema da rua Alexandrina!

Pulou da cabeça direto pra rua
Porque achou humilhação ser bit
Achou pouco figurar no papel
teve pressa
porque nem sempre, como tristeza
poesia se fez porque queria

Fato que poesia da rua Alexandrina
é maior e não cabe nestas poucas linhas
.apesar de serem minhas.
como não em nenhuma biblioteca de Alexandria

04 agosto, 2012

quer?

prende desde sempre. viu-se pouco, mas olhar parou no rosto, tonto. era do tipo rosto pronto. Some-se, convida-se sempre. e vai, um dia vai. e terão horas e oras para trocar.
tocar.
e quererá mais.
querer? vai. singelas notas belas musicais.

02 agosto, 2012

o cinema incendiou


Nos feriados já não cabia dormir até as três e ter por ar amor. Destrambelharam-se  fingidos, estranhos, ainda que sorridentes. As dependências de um não cabiam mais nas possibilidades do outro e aí não se aponta culpados. Pena do que poderia ter sido não cabe. O acaso generoso que junta é o mesmo mordaz que afasta. Sincronizaram-se. Se antes para a junção, agora para a estrada. Não há impasse, não há crise. Tudo tende à harmonia. 

31 julho, 2012

20 julho, 2012

cortina

Não falo o suficiente como quando a garrafa de vinho fica vazia. Não danço o suficiente como quando fico sozinha. Não canto o suficiente como quando a casa dá eco. Enfeites de cabeça, maquiagens de corpo, roupas estandarte. Pra que, se o meu puro é muito mais?

19 julho, 2012

bar e biritas

Quero um dia ser garçonete
de Cochabamba bar e biritas
conquistar mil almas partidas
findar a minha partida em sete 

deliciar o andar de mesa em mesa
sem deixar de mão em mão
receber 999 cartas de não
cheia de história sumir de nau inglesa

16 julho, 2012

melhora

a subjetividade toma conta e todo mundo sabe a dor que é. o frio tem ficado gelado demais. os esperançosos tem se dado o direito de reclamar. até eu me pego no apego. e quando a falta de fé é proclamada e compartilhada, toda legião - não numerosa - de crentes, fica contamidada. mas passa. é coisa de hora.
acreditar é doença que fica latente e no próximo sol quente
melhora

14 julho, 2012

ela no fundo

Sou o cântico de ninar
e
sou a dama puta que
dormente se apavora com a pergunta
Em qual delas erro mais?
Se me tornando as duas
Sei. nenhuma sou demais
a realidade delas cruas
é minha paixão plena pelas duas
que se fazem mil e uma
E a cada uma
Uma fenda que se funda

Eu preciso das mil e duas fendas
Pra achar, breve, volátil, no fundo
ela, persona, sorrindo pra cima, imunda
Lateja-me assim:
em mim você não erra
 eu é que te sou
Na fenda funda dessa terra

10 julho, 2012

dágua

O mundo, apesar de inquisitor de mim, não tem me deprimido mais. Mas esse peso no peito, esse coração acelerado, essa iminência de enfarte e a enorme necessidade de afastamento, tudo isso, tem deixado tudo mais opaco. A arte cava diariamente um poço mais profundo em meu coração e, a cada dia, os baldes tem saído com menos água. É não ter o poder de fazer nas mãos que me consome, mas menos do que o medo que sinto, o medo dos indecisos. Eu sinto demais, fisicamente, cada pensamento afoito a respeito do que se deve ser feito. Não tenho culpa dela ter aparecido - todos os dias me culpo por ela ainda tomar lugar aqui. O mundo realmente não tem me deprimido, mas me cansado. O poço cada vez maior e largo, os baldes mais sedentos. Recebem  três pares de gotas a menos a cada retirada. Todos meus sensos intensos perdidos na nova paixão, na antiga tristeza do nem ser.

16 junho, 2012

do máximo


Do máximo
Reduzido a mínimo
Traduz momentos íntimos
Em pouco espaço
Espaço oco
dentro da caixa
é espaço outro
em que outro se acha
big bang ao avesso

que vivi em tal endereço




mas bom conselho
em tratar-se de universos

tratar-se de águas novas
em tratar-se de sedes
é viver os universos 
no ínfimo de quatro paredes

04 junho, 2012

Com pressa

Véi. Te liga, se toca!
Seu dentro tá bem conhecido até demais
E, sinceramente, pouquíssima gente se importa
Sai da toca e cai ver vida a partir da sua porta
Sai desses desimportados feelings banais
Vidinha marota não vale
Tenha pressa
Tenha pressa
O movimento do mundo não cessa
Ainda por cima, fi de rapariga, passa
rápido a beça

30 maio, 2012

Para chegar aos 97

Entregue-se, ele disse

Se mais entregue que eu agora não outra eu nunca fui

 nunca fui tão entregue porque agora vi que queda nunca é demais

Colocar fé no que é bom nunca é demais, nem erro, nem acerto, são páginas tais

Como sais no espírito, de limpeza de puro de novo descanso

sentimentais

não importa o quanto seja duro o depois

pois depois da dor vem um copo pelo meio e sempre outro amor

Porque já que o copo está sempre meio cheio

eu quero sempre o corpo cheio inteiro

Cheio inteiro

Corpo cheio inteiro de coisa dentro

Tão inteiro por dentro que por fora é nu

Muito nu

Mas limpo e lindo de tanto cheiro

...já que nudez me cheira tanto...

Cheiro certeiro vivido que ainda tem muita vida pra viver

E curiosidade suficiente pra querer ver

Ver viver de cara a cara frente a frente com sutilezas a somar

Com energia suficiente em fichas pra apostar,

Com um novo dia de novo jornal e um novo café no meio do copo

Enquanto o meio do corpo dança danado pelo quarto

Ele sempre vai dançar

E as páginas tais serão sempre bem dançadas

Senão, como eu posso sustentar o discurso de viver até os 97?

14 maio, 2012

Começa assim

Geralmente começa assim.  Vários pontos formam retas e planos de vista em comum, quando eles menos esperam já estão sorrindo e se arrepiando pela vontade de agarrar aquele corpo e beijar aquela boca que não para de se mexer oferecidamente. Do querer sentir aquelas mãos expressivas em suas costas e coxas e aquele corpo ágil em sua cama, vai-se para as pernas que se tocam embaixo da mesa; depois, eles se beijam e se abraçam e sentem a textura, a lisura e a pura livre sensação de todo aquele ser imagético ser agora tocado e mordido e degustado. Depois eles conversam um pouco mais, descobrem pontos retas planos e esferas em comum. Acham que podem aprender um pouco mais um do e com o outro. Trocam cartas, falas, filmes, energias e intenções - não das mais puras, mas carregado de solturas, pra assim trocar um pouco mais do que fluídos, já que passaram da idade. E flertam. Flertam. Até lembram calorosamente um do outro em uma ou outra masturbação. Até que um dia se encontram com olhos parametrizadores. Uma ou outra dose depois trepam, sentem-se externamente. falam muito mais que as imagens e filmes e palavras trocadas. Daí o tom da conversa muda do flerte para o que eu soul. Aí ele fala bastante pra encanto dela, ela fala pouco, como sempre e agora mais do que nunca, pra estranheza dele. Ele fala de tudo com naturalidade e ela acha linda aquela liberdade. Eles tomam, eles ouvem,e, mais uma vez, depois dormem e acordam para fumar. Ela, que é dada a observações, acha os gestos dele tão bonitos que construiria um personagem. Ele é tango e cítrico e samba, ele nunca passaria despercebido. Já ela brilha ultra violeta, não violenta, não visível. Até que num céu desabando sobre os dois, ela se vê de fora olhando pros dois na cama e acha tão bonito que não sabe se está apaixonada só por ele ou por ele e pelos dois juntos. E ela se reapaixona por si, por ele, pela dança dos astros traçando ruas e cruzamentos de destinos de arrepiar quarteirões. Geralmente começa assim. Mas é muito raro.

26 abril, 2012

Da porta do vão


Papéis soltos salpicam o chão, a parede, o vão

Da porta, olham para ela como louca. Ela dança e flerta satiricamente com eles, exibe-se, destoa-se e não aceita muitos conselhos. Carrega consigo uma mania de partida, uma sensação mal resolvida, sensações acumuladas de anos de vida. Ela é velha, ela é jovem, ela tem muitos anos em pouca idade. Ela tem grudados em seu corpo todos os panos da cidade. Ela é parte do cenário, ela é o próprio cenário dela. Brinca com os objetos, com a rotunda com ela mesma e com o público flerta. Ela é uma diaba e santa de faces lunáticas que ainda não foi retratada em estátua, pois não deixaria ninguém reproduzir o desenho de seus olhos se estes não comportassem sua alma. Não se importa em não ser reconhecida, prefere. Não sabe o que é ir nem voltar, ela fica, ela fere. Qualquer que seja o sentido da partida, ela fica. Estranha, aperta as mãos, os dedos, peitos, entranhas e vai, por partes ela vai: Inteiramente parte a parte.  Ela é dividida em mil quando parte, quando dança e olham para ela como louca. Ela não liga, se exibe e não aceita muito a maldade do mundo. Dança dentro de si cenário, flerta de modo bento, satiriza de modo sério, realiza de modo etéreo. Subjetiva, ela sub objetiva os podres e dança com frescor e citricidade. Ela não aguenta muito o mundo e a porta.

22 abril, 2012

sem título.

Não cuide de mim
já passei do tempo de pedir
para me afastarem do medo
para me contarem o segredo
da vida em fábulas antes de dormir

Não queiram me cuidar como criança
pode ser que nela eu me transforme
e grite, brigue, bata o pé disforme
fazendo de tudo, infantilmente, pura dança

Não me cuide demais assim
não me conforta nem um pouco
sinto meu espírito meio oco
porque sempre me afasto de mim


20 abril, 2012

pé de feijão

Um ciclo. uma ideia, uma conversa e dois dedos de café e os dois achando que falaram menos do que poderiam porque, afinal, na cabeça se passa muito mais, muito mais e mais ainda do que cabem nos dois dedos de café. Porque faltam muitos meses de coisas vividas pra entenderem o brilho dos olhos de cada um, os gestos e a brisa astrológica que nunca tinham citado nas outras tantas brisas. Aí entra um sol no quarto que não tinha, entra um bem te vi cantando e batendo nas quatro paredes, entra a música gospel que a faxineira da casa ao lado tanto gosta, entra um cheiro de pão com manteiga na chapa, entra um vento leve e entra sagitário e gêmeos e libra e um quezinho de escorpião. E entram quadrados e círculos e fumaças e cinzas e doze gotas d'água no pote de terra. E cai a semente de feijão que a vizinha cuja faxineira ouve gospel separou do feijão que vai cozinhar porque não serve pra ela. E nasce e cresce e dá. Eles cuidam, molham com mais uma dúzia de gotas d'água e conversam com a planta, que é de câncer ascendente em touro. E eles se preocupam com o futuro dela, deles, do mundo e se perguntam se é mesmo esse o caminho certo. Se enchem e preenchem de mais ideias, acham-se no lugar certo ainda que errado e falam mais um pouco em como pode ser tão moralista e injusta a sociedade, em porque as pessoas vivem a vida que vivem e do por quê eles também não se preocupam se estão mesmo no caminho certo; se eles estão preocupados, como eles, em fazer o que melhor se pode fazer com os dons que nos foram dados. E do como pode a faxineira cantar muito mais afinada e com mais coração do que a cantora que ela adora - e que tem mais conforto e admiração que ela. Aí eles falam sobre justiça, tomam mais dois e vão almoçar sob a lua vazia.

09 abril, 2012

Saco

sem senso sensível
é impossível
extrair suco do saco que o social é

04 abril, 2012

Para Henry Miller e umas tais Anas Cabreuvana


Os malditos são melhores, e recolocava o cigarro na boca com as mãos pesadas de tantos anéis. Ela dizia que os anéis ajudavam a dar um ar bonito pras mãos. E que todo mundo devia ter mãos bonitas. E, pra ela, de fato tinham, pois tinha um gosto tão duvidoso quanto seu humor. Era feia, ou quase feia. Era quase feia e tinha os gestos mais bonitos do mundo. Então era a mulher mais bonita do mundo. Ela dizia que a roupa ajudava. O humor duvidoso também. A conheci quando chegou com um bilhete escrito em papel de pão dizendo que eu era o mais charmoso e sujo que ela tinha visto até então, em poemas simples e toscamente rimados (afinal, toda e qualquer rima soa estranho). Se a tivesse notado antes a teria visto olhando pra mim sorrindo e escrevendo o bilhete. Teria visto um pouco dela entre a nuvem de fumaça de cigarro. Ela dizia que pra escrever qualquer merda que fosse precisava de uma nuvem de fumaça porque escrever era como tirar o gênio da lâmpada e na cabeça dela o gênio sempre saía envolto de fumaça. Depois de uns meses após o bilhete lembro de acordar pelado no meio da noite e vê-la também pelada escrevendo alguma coisa com um lápis quase sem ponta. Entre um surto e outro de escrita nervosa e apertada do lápis contra o papel ela tragava e olhava pro infinito. Era pra ter novas ideias e novas ideias que gerassem o próximo surto de escrita. Às vezes parava e ficava tremendo a perna direita como se fosse uma maquita contra o chão. Ela sempre me acordava quando, de madrugada, dava de escrever e fumar, tremendo a perna como maquita no chão e fazendo um barulho de articulação do joelho de mulher que já caiu muito na vida.

Mas não era dela que eu ia falar, ao menos não com foco.  Era dos malditos. Eu estava na fase Kafka quando caí nos malditos. Tinha também acabado de ler a bíblia e entrar na depressão após o apocalipse. Toda pessoa que lê o apocalipse vive um logo depois. Com todas as bestas possíveis. Mais de sete, dezessete bestas rondando as cabeças, afastadas somente num bar com alguma dama não tão dama ao lado. Mas dama. Nunca achei que não fossem. Pois sempre que eu me envolvia em uma briga ou vomitava litros de cerveja no chão elas se comportavam como damas ao me ajudar. Elas é que têm forças pra essas coisas. As outras damas nessas situações agiriam como meninas e teriam nojo. As minhas damas subiam no salto e me carregavam até minha casa, sem enroscar pedaços de mim em suas bijuterias baratas. Algumas até davam banho e de dama assumiam papel de mãe, como as damas sempre fazem quando sentem o instinto.  E mestras, quando essas mesmas damas se deparam com um burro como eu. Eu é que no fim me sentia enroscado nas bijuterias baratas e magnéticas delas. Uma me trouxe o Jimi Hendrix, outra a meditação e o tal tântrico que até hoje não entendo, outra o Henry Miller. E, como sempre pra quem acaba de ler o apocalipse, o palco estava com todo o seu cenário e pré-personagens prontos pra eu apocalipsar.

Apocalipsei noites e noites. Li os apocalipses dos malditos achando bonito aquela sujeira toda - e me acostumando com o vômito respingado no banheiro que eu não achava causa de morte não limpar. Quando você menos espera a maldição já é o terreno mais fértil e confortável pra pobres vagabundos como nós. A maldição vem e pica sua canela e coça, coça. Irrita, depois vira coceira gostosa até gangrenar a perna toda. E você ficar assim um amputado filho da puta sem nenhuma bosta no cu pra cagar.

Eu estava no tempo “sem bosta no cu pra cagar” quando tive uma revelação... 40 dias de deserto com um baita capeta que me roubava os cigarros. Não achava muito graça naquilo tudo, e como eu gostava de achar graça nas coisas, voltei pra beira do Nilo e sentei e chorei. Chorei pelo humor perdido. Era de chorar preferir os malditos, era de chorar sentir saudade das damas nem tão damas assim, era de chorar a força daquelas damas acima da fraqueza que erroneamente lhe apontava os outros” Pra quem é fraco como eu, a graça de ser maldito era quase nenhuma perto de ler e ouvir um maldito. Ou falar de um maldito. Eu cansei por um tempo de viver maldição porque me sentia meio idiota vivendo perigosamente sem coragem e morrer cedo pra ser imortalizado por um bando de jovens que me ouviriam ou leriam em suas camas confortáveis, sem nenhum naco de nuvem de fumaça em volta. Eu não me via mais brilhante como o gênio da lâmpada. Eu não achava tão bonito viver uma vida em um mundo e ser julgado pelos outros que parecem que vivem em outro mundo regido não pela lei do universo, mas pela lei da imagem da moral. O monstro do Nilo me contou que essa coisa de maldito é coisa pra gente forte. Coisa pra damas que não são tão damas assim e tem poder de mutação de puta pra dama pra dona e pra mãe. Pra quem não teria nojo ou sentiria qualquer ofensa em ser citada pelas bocas que não merecem cita-las. Eu saí da maldição rezando como um coroinha.  E tocou as Bodas de Fígaro e eu fui embora me sentindo mais eu. Idiota. Ao menos era mais confortável. Eu não tinha culhão pra dar a maçã do conhecimento pra Adão sabendo que aquilo me renderia toda a história que rendeu.

22 março, 2012

Rai que cai


Brilha lá fora
na curva do rio
barco vai embora
me deixa no frio

14 março, 2012

Jornal


Abro o jornal no banheiro
Para disfarçar o fedor fumo um paiero
pelas notícias cago de triste
a violência que pregam insiste

 Não há deus que tenha dó
desse povo que não dá ponto sem nó
clareio meus pensamentos na cerveja
que do comercial a loira quente põe na mesa

 mas não há nada mais o que se fazer
pois amanhã é domingo dia de lazer
fecho o jornal com pressa safa
minha mulher chora pela novela na sala

 meu filho entra rápido de olhar baixo
veio da rua e mais parece um capacho
nos responde mal e nos manda tomar no cu
acredito piamente na culpa da banheira do gugu

o jornal nacional propaga o terror
isso aumenta meu apego ao Senhor
rezo duas aves marias e deito mal
pois amanhã novamente se publica outro jornal.

22 fevereiro, 2012

herói nº2

esse ano ela ia dizer o que precisava
mui precisa
de mente
minuci
osamente
Para que não se fizessem de tolos munidos de "não entendi nada além"
Estava muito claro, é claro, que tinha decidido descer do muro
e nós sabemos que quando está bem claro na cabeça de alguém
ela acordaria pessoas, ainda que todo o mundo estivesse escuro

herói nº1

De roupas vermelhas saiu de casa pra fazer revolução. Não gritou, não carregou armas.
Suas armas eram mais brandas que as brancas. Não cortava, não alfinetava,

Alfinetava sim, mas não era direto.

Ele disse pra mãe: Não vou trampar com o pai não. Tenho que conversar com as pessoas um pouco.
Ele precisava ansiosamente como ansiosamente Clarice se entregava à maquina de escrever com polegadas de histórias.


15 fevereiro, 2012

bruxa

Vênus está aí, meu bem
ela dizia e deslizava naquela fresta de luz que passava pela da janela
As mulheres estão férteis e muito sensuais
e os homens também, ela dizia, os homens estão com a feminilidade a mil
Vai ser um ano de muito amor
amor ela olhava de canto e sorria tanto quanto
E minha meta é sobreviver ao fim do mundo
pretenciosa, ansiosa, vaidosa. narcisa, morreria afogada na própria imagem
Ano em que as bruxas vão se reencontrar para um chá
bruxa ela, - cheia dos cheiro- , pedras e sidras
Vai ser o ano dos orgasmos múltiplos,
ela dizia enquanto se ria, se ria como deveria
se ria em alto ótimo e bom som, como se deveria rir
naquela situação

tem certeza que deseja publicar sem assunto?

ah mas que merda, olha só quem volta ao pó, de branco e olha pra página e suspira por três linhas consecutivas
mania de saber que não dá e vai, tenta que dá, vai vai vai.
cansa, porque não vai, palavra briga com palavra e não vai aí
aí é aquela cara pálida de branca olhando o branco que olha pra sí
aí sim,
olha o vazio como o vazio engolindo indo fundo na gula, engole
a palavra, a palavra que não preenche o branco e
paira
paira

paira palavra suspensa solta no ar, eu sei alguém falou isso
é ... não fala não fala.. é o,
outra vez palavra branca suspensa na cabeça solta no ar

05 fevereiro, 2012

cara

tem que ter
tem que ter aquela cara
tem que ter sempre aquela fala
meio fala que não é falada
meio crise de risada
que por não ter sentido não salta
fica grudada
na cara aquele gosto de

24 janeiro, 2012

el otarión

Não tem poesia hoje
o poeta amanheceu com caganeira

a não ser que cagar realmente
seja bom pra fertilizar cabeça
ou o poeta se reinvente
e escreva palavras n'água da banheira

(seria um "até que enfim")

a gota de nada

vejo que

vejo nada

sei só que

sou alienada


sou o que

sei de nada

só porque

tô revoltada


vendo esperança caída

porque dia a dia se constata

que sobra morte nessa vida

01 janeiro, 2012

quarto escuro ou bom princípio de ano novo

Não.
Não me dê bom princípio. Eu não fui uma boa menina.
Eu menti. Eu roubei. Eu usurpei.
Eu fiz o que não devia.
Eu entrei num quarto escuro e roubei um rapaz que indefeso dormia.
Eu cheguei num dia de sol e conquistei um barrabás que amoado sentia.

Eu não fiz caridade.
Eu não ouvi o suficiente.
Eu não cumpri com minha idade.
Eu fui uma moça indecente.

Não me traga um bom princípio de ano,
pois não tive boa índole
Eu não cantei o suficiente
nem sorri pra todos decentemente

Não mereço boas vibrações
não mereço conquistar corações
pois toda minha cota
acho que gastei na adolescencia

Não me traga um bom ano
tudo que fiz não consegue superar o profano
me confundi
menti
extremi

eu fui longe demais

eu invadi um quarto escuro
que continha um moço
que, por minha paixão
pressionado contra o muro
se rendeu,
mas sinto não queria

pobre menino
pobre menina

e eu
podre


Eu falei demais.
Não me mande um bom ano.
só um dia
quando sano
eu não erre mais
mas não esse ano

Eu falhei demais.