27 janeiro, 2010

Por hoje

Você pode ficar assim um bom tempo. Um tempo bom, com a cabeça afundada entre meus seios enquanto eu falo sobre algumas coisas e você se amolece sonolento com o vibrar do meu peito que por minha boca se pronuncia. Você pode ficar por hoje, enquanto rimos e nos afundamos no colchão velho e nos exprimimos por olhares enquanto nos esprememos entre quatro paredes. Pode vir para umidecer minha pele, secar minha boca e desatar meus cabelos. Ficar por hoje, pela noite e pela manhã chuvosa que guarda nosso sono sem sonho, ou conversar sobre as belezas que só os artistas podem ver. Acendendo o meu, o nosso, que nos faz filosofar sobre o insustentável peso da margarida na mesa, já a ver a mesa, intacta, entortar-se à ela humildemente. E em nossos devaneios a margarida se ri soberana e murcha.
Venha e fique pela noite, pela manhã e pela tarde. Mas por hoje. Porque nossa cama também não consegue sustentar o peso dos nossos devaneios.

26 janeiro, 2010

mas tão, tão pequeno

tão pequeno que não cabe em uma linha

25 janeiro, 2010

escolha

O que eu faço?
ou
O eu que faço
ou
Eu que o faço

é só trocar aquele ali aqui e pronto

Preenchimento total

A cabeça assim, inclinada
os acenos de sins e nãos
e o vestido florido
as mãos cruzadas
e os olhos atenciosos
os chinelos saindo dos pés
e os pés angulando-se
o sorriso sereno
e a risada histérica
o rosto e o cabelo que mentem a idade
e as palavras que delatam
com o olhar de quem sabe do que
a voz forte
a voz terna
e os movimentos harmonicamente entrecortados

o preenchimento total da cadeira larga...

ficar ao lado dela
é o preenchimento total de imagens na minha memória

22 janeiro, 2010

momento tão

Certos dias nenhuma ideia vira frase, nenhuma frase se conecta com outra e nenhum texto vinga.
A melhor coisa é beber um conhaque olhando o céu, sentindo muito, arrependida de não escrever sobre tal momento tão



quem sabe até ouvindo Child in time do Deep Purple

21 janeiro, 2010

pêlo a pelo

Derrama

len

ta

men

tenho que dize-lo
até o momento dele
arrepiar-me pêlo a pelo
para desfazer rimas
para que sejam minhas
coisas atraentes mínimas
essências extra-fatos
para alguns, casos
para outros, estragos




(ah nova norma ortográfica)

17 janeiro, 2010

que com a gente nunca

Por isso agora a boca aberta, os olhos parados e focados em lugar algum a não ser no mundo que foi aquele tempo e aquela pessoa e aquele sorriso e aquele jeito e aquelas tardes e noites todas e aquela velha mania de achar que com a gente nunca.
E com uma seriedade imensa ou com um sorriso sincero, embora talvez preocupado, disse que sim. Era possível com a gente. Era possível com ele e não era minha descrença que faria diferença. Eu sem conseguir fazer nada me vendo ligar para ele e ouvir que é verdade com certeza. Então eu paro, ouço alguma coisa da cozinha, imagino que é ele advertindo-o sobre os riscos dos excessos do álcool, percebo que minha opção para dormir hoje é a hipótese de que amanhã, quando nos falarmos, ele vai dizer que quem sabe era coisa da cabeça e esses testes e eteceteraetal.
A vontade de fazer qualquer coisa, mesmo que infazível, de ver e de abraçar e dizer que mesmo sem sentir o gelado do chão nos pés, eu estou feliz.
E minha preocupação de como você tem sentido o chão nos seus.
Aquele quarto. aquela fumaça. Aquelas noites, quando nos fizemos nostálgicos como se hoje já fosse quarenta anos depois, se transformam em sóis sorridentes na parede amarelinha, rosa ou azul bebê. Transforma-se muita coisa, ele, a manta e o choro e o cuidado e todo aquele amor que eu sei: é o maior do mundo. E mais do que muitos, como poucos, ele é capaz de amar.

10 janeiro, 2010

palavras

E com tanta leveza e beleza Ele me tirou todas

http://poesiaehcoisadepoeta.blogspot.com/2010/01/para-ela.html
.
.
.
.
.

Fazer pé de meia pra velhice é uma besteira se você é adepto da bengala.


qualquer duplo sentido é puro dinamismo conceitual

05 janeiro, 2010

Dias estranhos

Os dias estranhos estão chegando. Vozes e notas na cabeça e o Dostoiévski que não se cala. E um corpo se confunde com o piso da sala.

04 janeiro, 2010

Aos que ficam em silêncio

cabe-lhes o nada após dois pontos

amado ano

Defenestraste-me, meu amado ano, velho, não sei se posso lhe dizer. Apesar de triste, gritou-me que me ama e eu que te amei. Gritou-me que você não era somente um dia, nem ao menos alguns reles meses. Você era um Ano, disse de boca cheia, enquanto eu me despedia de você completamente bêbada e consciente. Defenestraste-me quando meus olhos encantados pelos fogos artificiais se fecharam e meu hipotálamo não suportou o vento de verão.
Lembro-me que você, ano querido, disse em despedida para eu aproveitar meu novo amor, que eu fosse feliz com ele ao menos por mais tempo do que fui com você. Acho pouco provável. Contudo levo de você tudo, e não é pouco, que foi bom. As leituras, as expressões e as paixões.
Ironicamente, ano, defenestraste-me sem mágoas, nem eu de você, nem nós de nossa categórica felicidade. Me disse também alguns oxalás iemanjás e que na despedida do próximo eu não tenha sorvido tanto álcool a ponto de.